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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Cyro de Mattos Empossado no Pen Clube do Brasil

Discurso do Homem Real     

                                     
                                     Cyro de Mattos

            Ilma. Sra. Vice-Presidente do Pen Clube do Brasil,  Escritora Clair Matos. Na sua  pessoa,  estou saudando os ilustres integrantes desta Mesa.
            Illma. Sra. Doutora Olívia Barradas, estimada conterrânea, que  muito honra a Bahia com o brilho de sua inteligência e erudição, a quem agradeço as palavras ressaltando aspectos de minha obra literária. Incentivam-me a continuar na jornada.   
           Meus senhores, minhas senhoras.    
            Vou começar lendo este poema:

 Lá longe o velho sol
Não pintava os desertos
Com as cores da  manhã.
A lua não espalhava dores,
A chuva não fecundava
O ventre mineral da terra.
O vácuo inútil era tudo.
A  razão e a emoção
Estenderam a palavra
No vazio do mundo.
Com suspiros e pesares
A vida deu-me os sabores.
A poesia, os rumores.

              Assim é que eu chego a esta Casa das Letras, portador da crença de que sou útil à sociedade quando me exerço na aventura da linguagem. Bem sei que, nesta aventura, não consigo solucionar os problemas econômicos, políticos, sociais e religiosos. Mas é assim mesmo que eu sou e caminho entre seres e coisas, o guardador de memórias, cúmplice do eterno riscado num instante.  É esta minha maneira de estar sozinho, dar testemunho ao meu tempo.  Ainda que seja um grão no deserto, onde tudo eu arrisco, todo tecido de ilusão é esta minha condição,  o meu lugar, pois é aqui que me sinto como um homem real. Sem essa hora no caos desencanto-me. Lembro Fernando Pessoa: “Tudo é ilusão. Sonhar é sabê-lo”. Com a palavra que me representa nos instantes idênticos de dores e ternuras, fecunda o imaginário  e escuta o espírito do mundo  é que busco dizer em versos o contrário das coisas. Escrevo histórias para adultos e crianças pensando tornar a vida viável. Descubro rostos, abro portas,  questiono fissuras e rupturas, sou surpreendido com graça e alegria no reino dos pequenos.  Acontece a reinvenção  do pensamento lógico e do pensamento mágico. Os  sinais visíveis da escrita, tão antigos, são que me anunciam cativo da solidão solidária. Bem ou mal, tentam dizer o quanto eu sou  no certame do amor e da dor. Afirmam que sem a literatura  não há a lágrima, o beijo, o sorriso, o epitáfio. Não há a música dos sentidos.   
                Com a literatura sou  capaz de mergulhar no tempo e constatar que na idade dos homens o país do antigamente  tem o gosto de uma fruta que termina. Fica sem os verdes e os azuis, trancado lá dentro. Assim está minha voz no poema “Infância”.

 
O meu boi morreu
Que será de mim?
Não posso ir buscar outro
Nem lá em Pasárgada
Nem lá no Piauí.

Quem matou meu boi?
Foi a pancada dessa chuva,
O febrão desse verão,
A dureza dessa pedra
Quando topei e caí?

Na gangorra dos quintais,
Nas águas de meu rio,
Nos campos de futebol
Dos terrenos baldios
Quem matou meu boi?

Montava no lombo dele,
Eu voava com meu boi,
Eu saia aí pelo mundo
Que conhecia num só dia,
Sem precisar ir longe daqui.


Meu boi mágico de circo,
Meu boi bumba-meu-boi.
Meu boi divino no Natal
Meu boi palhaço no carnaval.
Quem matou meu boi?

No rigor de atitude o tempo
Que comanda o mundo
E não depende de mim
Foi o que matou meu boi?
Quem me dera fosse estrela
Para dançar com meu boi
No folguedo de madrinha-lua.

Botava ele pra comer capim
Beber água da bica no cocho
Feito de casca de cacau.
Eu adormecia sem ter medo
Quando ele cantava para mim
Que tinha uma cara preta.
Quem matou meu boi
Não sabe o que fez de mim.

            Sem a literatura nunca vou dizer do homem no gesto de extrema brutalidade. De seu ataque às Torres Gêmeas  fazendo ressoar o mundo a Deus como absurdo. Assim escrevi o poema “Derrame de Dor”, dedicado à memória daqueles que morreram vítimas de tamanha estupidez, em 11  de setembro de 2001, em Nova York.


Ceifados os sonhos pela fúria do insano matador
Dor e tristeza soluçam pelos que morrem sem defesa.
Tantos e nada podem fazer para provar a inocência.
Nessas duas torres da agonia. Nesse trágico voo cego
Partilhado com o pânico. Por mais que eu saiba 
Os dias errantes e nefastos de duas guerras mundiais
Que se instalam com horror no inferno de nós mesmos.
Sinto  o gosto de  Guernica, Pearl Harbor, Hiroshima.
O  quanto sou nos escombros. Todo esse peso terrestre
Estraçalho no peito diluviano. Agacho-me sem limites. 
Escrevo-me às avessas deslocando sem dó e lágrima
A eterna aurora para o mais profundo dos abismos.
Ó peleja de traumas. Arde sem trégua. Vaza gritos
Que  ferem. Sufoca-me no terror do mundo fugindo.  
Seus  ritmos rasgam  a manhã nas  desconstruções do ego. 
 Habito este  som  e não entendo. Este modo feito medo.
Os gemidos da noite. O embate da fúria repetindo negações. Contra o amor e o riso. Como dói. Como dói tudo isso.

       Há quem ache que ser escritor é destino, fatalidade que começa mal desponta a manhã.  Não deve ser nada bom. Não pode ser mesmo para quem sustenta, na sua maneira de achar estranha a vida, todo o peso terrestre, embora existam os pássaros cantando a madrugada com suas cores suaves.  Para que serve a poesia? Respirar e viver, disse Borges. Expressar que dentro de mim o rio flui, o mar cerca por todos os lados, anotou Eliot. Para que serve o romance? Conhecer Deus e o diabo nas vastidões do sertão alado do mineiro Guimarães Rosa. Ler o mundo quando ele diz que maior do que os confins daquele sertão mineiro é o que descamba sem fim depois do lado de lá, naquele destamanho de um enigma que ninguém consegue decifrar.  
      Precisamos da literatura como a atmosfera. Dela nos servimos para inaugurar novos sentidos da vida. Sem querer polemizar, penso que a literatura é uma profissão da qual não pode fugir quem a abraçou de verdade. É condição,  ato ou efeito de professar, perseguir, proferir crenças e valores. Declarar publicamente ao outro que não vivemos sozinhos, navegamos em águas precárias em que as perplexidades avultam. Nosso discurso não é feito para agradar a grupos. Com a diversidade que celebra seres e coisas, costuma perdurar nas lembranças, incertezas e esperanças. Se quiserem, pode ser uma missão, pois tudo dá ao outro sem nada querer de volta. A literatura é capaz de salvar o mundo. É o caminho  para que os povos encontrem-se como  irmãos, sintam-se em total união do amor como verdade.
       Peço a vocês um pouco mais de tolerância. Desculpas por estar dizendo o que vocês todos sabem. Já vou terminar  com meu jeito de homem do interior nascido no sul da Bahia, região que já teve ricas e vastas plantações de cacau e que deu para o mundo os romancistas Jorge Amado e Adonias Filho, mas que também acontece com outros talentosos escritores e artistas.  Sou de Itabuna, cidade  importante de um território que ocupa lugar de destaque nas letras brasileiras.  Com os meus passos hesitantes de quem inicia nova experiência de vida, de homem que preferiu ser um fazendeiro do ar ao invés de abastado produtor de ouro vegetal,  bato palmas e digo:  Ô de casa, gente, posso entrar? Peço licença para sentar entre os membros titulares  desta Casa das Letras. Venho aprender com todos vocês, personalidades importantes de nossas letras, de como é necessária,  hoje como ontem,  a defesa da liberdade de expressão para que o ser humano devolva a ele o que sempre foi de sua essencialidade: o braço ao abraço, as mãos nas mãos, pois assim a vida fica mais fácil.   Venho para  desfrutar de um convívio saudável, que transita com desejos e afetos, de tal sorte nas ondas da compreensão que anima a incrível complexidade da vida.   
       Agradeço a Deus por ter me colocado nesta estrada, fazendo com que chegasse até aqui; à minha esposa Mariza,  neste instante compartilhando com o amado a vida com alegria; à Doutora Helena Parente Cunha, conterrânea  sempre lembrada, escritora de minha admiração, amiga que me indicou para ingressar nesta Casa; ao presidente Cláudio Aguiar, que mesmo impossibilitado de comparecer a esse evento por motivos de saúde sempre se mostrou diligente para que tudo fosse bem realizado; e a vocês, que vieram prestigiar, meus sinceros agradecimentos. 
         Termino como gosto em ocasiões como essa.
          Leio o poema que escrevi ontem, à noite, no hotel:

A Árvore e a Poesia

A árvore dá as flores
A  poesia dá o perfume
Nos fios sem fim do sonho

A árvore dá os frutos
A poesia dá as palavras
Onde põe suas verdades

A árvore dá a casca
A poesia dá as rugas
No galope do tempo

A árvore dá as folhas
A poesia dá as visões
Nas vestes da vida e da morte




*Discurso proferido pelo escritor e poeta Cyro de Mattos, ao ser empossado no Pen Clube do Brasil como Membro Titular, em 23 de outubro último, no Rio de Janeiro.




O poeta Cyro de Mattos mostra aos convidados seu diploma de membro titular do Pen Clube do Brasil; na mesa oficial, a vice-presidente Clair Mattos, o escritor Eduardo Portella, da Academia Brasileira de Letras, e doutora Olívia Barradas, Professora Emérita da UFRJ, que proferiu o discurso de saudação.


O poeta Cyro de Mattos com os professores  Olívia Barradas e Eduardo Portella.


 O poeta adentra o salão nobre do Pen, conduzido pela escritora Gilda Sousa Campos.


Escritora Luíza Lobo, Olívia Barradas, Eduardo Portella, Cyro de Mattos, esposa Mariza e a escritora Helena Parente Cunha, Professora Emérita da UFRJ.



Cyro de Mattos na mesa oficial com o doutor Bernardo Maciel, vice-presidente Clair  Mattos, Eduardo Portella e Olívia Barradas.


O poeta assinando a ata de sua posse no Pen. 

terça-feira, 22 de outubro de 2013

XVI Encontro de Poetas Iberoamericanos em Salamanca – Espanha




Trinta e cinco poetas de diferentes lugares: Brasil, Colombia, Uruguai, Nicarágua, Equador, México, Portugal, Bolívia, Portugal e Japão estiveram em Salamanca para homenagear Fray Luís de León durante o XVI Encontro de Poetas Iberoamericanos promovido pela Fundação Cultural de Salamanca,  nos dias 2 e 3 de outubro.   A antologia “Decíamos ayer”, reunindo  poemas de cada poeta convidado, foi publicada pela Fundação Cultural de Salamanca como parte das homenagens prestadas a Fray Luís de León durante o XVI Encontro. 




 Os poetas brasileiros que figuram na antologia são  Cyro de Mattos, Álvaro Alves de Faria, Rizolete Fernandes e Paulo de Tarso Correia de Melo. 
Dentre outros atos do Encontro constou com destaque  o  lançamento dos livros “Onde Estou e Sou/Donde Estoy y Soy”, de Cyro de Mattos, “Almaflita”, de Álvaro Alves de Faria” e  “Vento da Tarde”, de Risolete Fernandes, no Centro de Estudos Brasileiros, com apresentação dos poetas e leituras de seus poemas. . Cyro de Mattos ainda participou da abertura de exposição de uma vintena de seus livros no Centro de Estudos Brasileiros. Além disso,   fez leitura do seu poema dedicado  a Fray Luís de León no Teatro  Liceu. 


Cyro de Mattos no Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Salamanca.


Não  menos representativo foi o ato que teve lugar na Faculdade de Filologia da Universidade de Salamanca sobre a poesia colombiana no qual participaram  os poetas: Jorge Cadavid, Juan Felipe Robledo, Catalina González  e Juan Pablo Roa, apresentados na oportunidade pela  professora de Literatura Hispanoamericana da USAL, poeta Maria  Ángeles Pérez López.

O XVI  Encontro de Poesia  Iberoamericana em Salamanca teve uma convidada especial, a japonesa Satoko Tamura, poeta e  tradutora de García Márquez, Neruda e  Vallejo, entre outros.

Ela pôs um toque oriental no Encontro,  participando dos atos  vestida com o quimono. Além de ler seu poema no Teatro Liceu, pode  dar a conhecer sua obra na   Casa do Japão, onde  esteve acompanha do pintor  Miguel Elías, que manteve um  diálogo com ela e o público  para que ficasse conhecido o rico mundo poético dessa simpática poeta Satoko Tamura.  


 Satoko Tamura




sexta-feira, 18 de outubro de 2013

"Vinte e Um Poemas de Amor" em Portugal


Lançamento do  livro "Vinte e Um Poemas de Amor", de Cyro de Mattos, na Casa da Escrita, da Câmara Municipal de Coimbra, Portugal, no dia 30 de setembro último. Nas fotos aparecem o poeta baiano (de Itabuna) com a Doutora Graça Capinha, da Universidade de Coimbra, que apresentou o livro, e  o editor e poeta Jorge Fragoso. 
 



domingo, 13 de outubro de 2013

Poesía bilingüe en el Centro de Estudios Brasileños


El Centro de Estudios Brasileños de la Universidad de Salamanca (Plaza de San Benito,1) acogió la presentación exclusiva de tres poemarios de autores llegados de ese país, y que han sido publicados en portugués y español. Esta actividad se encuadra dentro del XVI Encuentro de Poetas Iberoamericanos.

DE MATTOS, ALVES DE FARIA y FERNANDES

Se trata de la presentación del libro Donde Estoy y Soy (Ler Editora, Brasilia, 2013), de Cyro de Mattos; poeta que es miembro de la Academia Bahiana de Letras, su estado natal. Los otros poemarios son Alma Afligida (Trilce Ediciones, Salamanca, 2013), de Álvaro Alves de Faria, poeta nacido en Sao Paulo y que el año 2007 recibió el homenaje del X Encuentro de Poetas Iberoamericanos, entonces dedicado a Brasil; y Viento de la Tarde (Sarau das Letras/ Trilce Ediciones, 2013), de Rizolete Fernandes, poeta que viene de Natal, capital del estado de Rio Grande do Norte, en el nordeste brasileño.

TRADUCCIONES DE PÉREZ ALENCART

Los tres libros han sido traducidos al castellano por A. P. Alencart, poeta, profesor de la Usal y coordinador de los Encuentros de Poetas Iberoamericanos que organiza la Fundación Salamanca Ciudad de Cultura y Saberes. La presentación de los poemarios estuvo a cargo de Luis Frayle Delgado, Juan Ángel Torres Rechy y Montse Villar. La lectura de poemas en español estuvo a cargo de poetas y lectores salmantinos: Soledad Sánchez Mulas, María del Carmen Prada Alonso, Juan Carlos López Pinto, Jacqueline Alencar, Luis Gutiérrez y María Ángeles Moreno Plaza.

XVI Encuentro de Poetas Iberoamericanos em Salamanca, Espanha


Cyro de Mattos lê seu poema "Soneto de Fray Luís de Léon"
no Teatro Liceu de Salamanca, Espanha, durante o XVI
Encontro de Poetas Iberoamericanos; a seguir, o poeta Alfredo
Pérez Alencart faz a leitura do poema em espanhol.



“Ó Salamanca do espanto a me achar
Na morada desse sol, que é mais forte,
Flor que se sobrepõe a todo instante.”



Jorge Fragoso (Portugal), Leyendo el Poema de Antonio Salvado




sábado, 12 de outubro de 2013

Convite


União Brasileira de Escritores
Homenageia os Melhores do Ano




Como acontece todos os anos, a  União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro, através de sua Diretoria, elege os melhores livros e autores do ano,  que recebem  os seus honrosos prêmios na primavera carioca, com o nome de consagrados escritores das letras brasileiras. A solenidade da entrega dos prêmios neste ano será no salão nobre da Academia  Brasileira de Letras, no dia 25, às 15 horas.
Um dos premiados nesta temporada é o escritor baiano (de Itabuna) Cyro de Mattos, que irá receber a láurea Jean Paul Mestas por seu livro “De tes instants dans le poème/De teus instantes no poema”, publicado  pelas Editions du Cygne, Paris, na coleção Poesia do Mundo, com prefácio de Margarida Fahel, professora da UESC.  O  poeta Pedro Vianna, também receberá a mesma láurea por sua versão do livro  para o francês. Com este prêmio, Cyro de Mattos alcança a marca de dez láureas concedidas pela UBE/RJ, entre livros de poesia,  literatura infantojuvenil e organização de antologia.

Eis a relação dos autores premiados neste ano e seus respectivos patronos

PRÊMIO GUILHERME DE ALMEIDA para PAULO BOMFIM PRÊMIO GUIMARÃES ROSA para FÁBIO LUCAS
PRÊMIO FERNANDO PESSOA para ANTONIO CARLOS SECCHIN
PRÊMIO CASTRO ALVES para DIEGO MENDES SOUSA
PRÊMIO MACHADO DE ASSIS para MIGUEL JORGE
PRÊMIO HENRIQUETA LISBOA para YEDA PRATES BERNIS
PRÊMIO BENEDITO NUNES para OLGA SAVARY
PRÊMIO JOÃO CABRAL DE MELO NETO para  MARCUS VINICIUS QUIROGA
PRÊMIO HERNÂNI DONATO para FERNANDO PY
PRÊMIO BARBOSA LIMA SOBRINHO para  CÍCERO SANDRONI
PRÊMIO MONTEIRO LOBATO para LAURA SANDRONI
PRÊMIO CLARICE LISPECTOR para  BEATRIZ ROSA DUTRA
PRÊMIO VINÍCIUS DE MORAES para ELISA FLORES
PRÊMIO ADONIAS FILHO para OLÍVIA BARRADAS
PRÊMIO PAULO RÓNAI para  LÍVIA PAULINI
 PRÊMIO CASSIANO RICARDO para LEILA ECHAMIÉ
PRÊMIO ZILA MAMEDE para ELIZABETH MARINHEIRO
PRÊMIO PEREGRINO JÚNIOR para NELSON PATRIOTA
PRÊMIO CLEMENTINO FRAGA para ABÍLIO KAC,
 PRÊMIO  ADÉLIA PRADO para MARIA AMÉLIA AMARAL PALLADINO
PRÊMIO MANUEL CAVALCANTI PROENÇA para IVAN CAVALCANTI PROENÇA
PRÊMIO MARGARET MEE para EVANDRA ROCHA
PRÊMIO WALMIR AYALA para JUÇARA VALVERDE
 PRÊMIO MURILO MENDES para JOSÉ SEBASTIÃO FERREIRA
 PRÊMIO CHICO BUARQUE DE HOLANDA para COLBERT HELSINBORG
 PRÊMIO FLORBELA ESPANCA para IDALINA P. A. GONÇALVES
PRÊMIO SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDERSEN para GONÇALO SALVADO
PRÊMIO JOSÉ SARAMAGO para MIGUEL BARBOSA
PRÊMIO EUGÉNIO DE ANDRADE para VICTOR OLIVEIRA MATEUS
PRÊMIO ANTÔNIO OLINTO para RONALDO CAGIANO
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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Brasil Dá Largada na Feira do Livro de Frankfurt


"O que significa ser escritor num país situado na periferia do mundo, um lugar onde o termo capitalismo selvagem definitivamente não é uma metáfora?" As palavras do escritor Luiz Ruffato foram as primeiras pronunciadas em português no palco da cerimônia de abertura, nesta terça-feira (8), da Feira do Livro de Frankfurt, que tem o Brasil como convidado de honra.
Após as boas-vindas alemãs, o discurso de Ruffato abordou a desigualdade e as injustiças sociais brasileiras, o sistema de ensino falho e a falta de acesso à leitura. "No país inteiro há somente uma livraria para cada 63 mil habitantes", afirmou. O autor destacou o "papel transformador da literatura", que disse o motivar a escrever. Por suas palavras, foi elogiado pelo ministro do Exterior alemão, Guido Westerwelle, que discursou em seguida.
As críticas de Ruffato à realidade brasileira arrancaram longos aplausos do público, mas também reações exaltadas, como a do cartunista Ziraldo. "Não tem que aplaudir! Que se mude do Brasil, então!", disse de pé.
Além de Ziraldo, diversos outros nomes integrantes da comitiva de 70 autores brasileiros em Frankfurt formaram a plateia do auditório com quase duas mil pessoas, como Ruy Castro, Daniel Galera e Nélida Piñon, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL).
A atual presidente da ABL, Ana Maria Machado, fez um discurso menos político e mais poético que o de Ruffato. A escritora convidou o público alemão a mergulhar na literatura "plural, múltipla e diversa, em que os regionalismos eventuais se esgueiram pelas frestas de um cosmopolitismo inesperado". "Não venham procurar o exotismo e o pitoresco", advertiu.
Literatura e política
A abertura da passagem do Brasil como país convidado da 65ª edição da maior feira literária do mundo -- quase 20 anos após a primeira homenagem, em 1994 -- também foi marcada pela fala de figuras importantes da política brasileira e alemã.
Westerwelle ressaltou a parceria Brasil-Alemanha em termos econômicos e quanto a valores comuns – democráticos, de direitos humanos e culturais. "A presença de tantos autores brasileiros aqui na cerimônia de abertura é uma prova do valor dado à cultura pelos brasileiros. E a cultura nos une", disse.
O vice-presidente brasileiro Michel Temer também abordou questões democráticas e afirmou que o país viveu um avanço político-social nos últimos 25 anos, desde o estabelecimento da Constituição de 1988. Mas, ao tentar fugir da política e entrar no campo pessoal, Temer arrancou vaias da plateia.
"Eu mesmo publiquei um livro de poemas, que tem muito da minha infância. E até hoje não recebi nenhuma crítica por ele, nem positiva, nem negativa", disse, para surpresa dos presentes.
Já no pavilhão do Brasil, a ministra da Cultura Marta Suplicy discursou em clima de festa, ao som de música brasileira, regada a pão de queijo e caipirinha. "A feira traz apenas uma amostra de nossa maior riqueza: a cultura", disse.
Para quebrar clichês
Para o projeto Frankfurt, que abarca a feira do livro e a programação artística paralela ao evento, foram investidos 18,8 milhões de reais do governo, provenientes do Ministério da Cultura (MinC), do Ministério das Relações Exteriores, da Funarte, da Câmara Brasileira de Livros (CBL) e da Biblioteca Nacional (BN).
Renato Lessa, que assumiu a presidencia da BN em 2013, critica o modelo de financiamento atual da feira, com somente fundos governamentais. "Vale o investimento na imagem do país, mas acho que o gasto pode ser melhor distribuído, porque também é uma feira de negócios, comercial. Temos um setor privado de editores muito robusto e acho que, no futuro, devemos adotar um modelo compartilhado entre Estado e setor privado."
Lessa destacou a feira como uma oportunidade de promover a cultura brasileira, mas disse que deve haver uma continuidade de políticas públicas nesse sentido, como o programa de bolsas para a tradução de autores brasileiros da BN e parcerias com museus. O presidente da BN aposta no conteúdo dos debates a serem promovidos pelos autores brasileiros em Frankfurt nos próximos dias e também destaca a qualidade do pavilhão do país.
Com 2.500 metros quadrados, o pavilhão foi concebido por Daniela Thomas e Felipe Tassara e construído todo em papel, com paredes sinuosas em homenagem a Oscar Niemeyer e ao Modernismo brasileiro. O objetivo do espaço é mostrar um Brasil moderno e contemporâneo.
"Acho que se tem muito o estereótipo de que o Brasil é o país do samba, do futebol, é uma selva. Temos tudo isso sim, mas temos mais. Temos nossas arquitetura moderna, nossa contemporaneidade, nossa inventividade. O pavilhão e a programação tentam mostrar a produção contemporânea para além dos clichês", afirmou o curador e coordenador do Projeto Frankfurt 2013, Antônio Martinelli.
Fonte Bol Notícias (internet)

terça-feira, 8 de outubro de 2013





A Cara da Morte
                                
                                      (Crônica de Cyro de Mattos)
                             
Queria acompanhar um enterro e ver  pela primeira vez  como era que  enterravam o defunto no cemitério. O enterro às vezes passava pela rua do comércio. As pessoas cabisbaixas atrás  seguiam o caixão com o defunto, que era levado pelos homens mais jovens. Quando cansavam,  revezavam-se. Outros homens seguravam agora nas alças do caixão, e o cortejo prosseguia em silêncio na rua de chão batido. Contornava a rua do comércio, rumo ao cemitério.
 Gente parava nos passeios, tirava o chapéu em sinal de respeito ao morto,  curiosos apareciam na porta das lojas. Ficavam olhando o enterro  passar  com as  pessoas tristes. Algumas levavam flores nos braços, os parentes e amigos do morto. Quando era enterro de criança, meninos e meninas  acompanhavam o cortejo à frente do caixão,  vestidos como  anjo  num camisolão de cetim branco,  uma coroa de flores na cabeça. Tinham asas feitas com penas de galinha, presas às costas. Levavam flores alvas e cantavam canto de igreja com os pequenos corações contritos.
 A primeira  vez que vi um enterro de  criança soube então  que menino como eu também morria. Ia para o céu, claro, o padre dizia isso na missa, que Jesus gostava muito das crianças porque eram puras, não tinham os pecados de  gente grande. 
Mas o que era a morte, comecei a indagar lá em casa. A mãe falou que era uma mulher feia, mas quem acreditava em Jesus e seguia os preceitos que o filho de Deus ensinava não devia temê-la. Quando ela chegava para carregar uma pessoa  para o além, que é o outro mundo, quem  foi bom aqui nesta terra, não cometeu pecado pesado, vai  ter o seu anjo de guarda para levar a  alma para morar na casa de Nosso Senhor. Quem foi mau, cometeu os piores pecados, como matar o semelhante,  a morte leva a alma dele  para o fogo do inferno. Quem foi ora bom, ora mau, vai ser levado  para o purgatório, uma espécie de lugar onde a alma fica sofrendo pelos pecados menos pesados que cometeu  até se purificar e alcançar o perdão de Deus.
Tudo isso que a mãe explicava sobre a morte podia ter sua verdade e até me  convencia em parte  sobre o que essa mulher  feia  gostava de fazer a cada pessoa que levava para outras terras. Só não gostava quando  perguntava  se um menino  depois de morto podia voltar de novo para brincar com os amigos aqui na terra, e a mãe revelava   que nunca ninguém soube que isso já havia acontecido um dia.
-  Então a morte que vá  comer bosta de galinha! – dizia eu, fazendo com que minha mãe desse uma boa risada.
Quando perguntava ao pai o que era a morte, ele prontamente dizia que com ele a bicha imunda não viesse se fazer de prosa. A taca de couro grosso estava ali mesmo guardada no baú para dar umas boas tacadas na indesejada, se ela  algum dia entendesse de querer lhe fazer uma visita.
Sorria agora eu, satisfeito com a coragem  que o pai demonstrava para fazer correr a morte, se ousasse aparecer lá em casa. Ia receber na mesma hora  uma boa surra aplicada nas costelas dela com a taca de couro grosso.
Naquele dia resolvi acompanhar o enterro que passava pela rua do comércio com poucas pessoas. No início acompanhei de longe, precavendo-me para que algum amigo de meus pais não me visse e fosse  contar depois  o que eles certamente não  aprovariam. Ficariam zangados e me colocariam de castigo. Proibido de brincar com os amigos por vários  dias.
Quando da ladeira em que o enterro subia vagaroso se avistou o muro do cemitério, aproximei-me por trás das pessoas que participavam daquele cortejo calado, com seus ares tristes. Pouco depois, entrava com  o enterro  no cemitério, que eu via pela primeira vez e que  me deu com seus ares sombrios um frio na barriga, como nunca tinha sentido. Tímido passei os olhos pelas  galerias com muitas gavetas  tapadas com tijolos, pintadas de cal. O nome do falecido inscrito em cada gaveta. Observei capelas com retrato dos falecidos lá dentro, escultura de homens  importantes em cima dos mausoléus de mármore. Lá embaixo, a terra cheia de cruzes  indicava  covas rasas, provavelmente ali  os pobres eram enterrados. Foi para lá que o enterro se dirigiu.
A cova já estava cavada num buraco para receber o caixão com o morto.  Antes de descerem o caixão, a mulher de cabelos brancos, num vestido pobre, pediu que tirassem a tampa. Queria ver o marido pela última vez. Ela  passou a mão no rosto do morto, que estava preto feito  carvão, os olhos fechados. A mulher começou a chorar alto. Esperei que  descessem devagar o caixão no buraco, estava amarrado com cordas grossas pelas alças..O coveiro jogou depois pás de terra, que aos poucos foi enchendo o buraco. A mulher continuava a chorar alto. Comecei também a chorar e, antes que ouvissem meu choro, fui saindo dali nervoso, tropeçando nos passos.  
MORRE AOS 95 O 'SACERDOTE-ARTISTA' MESTRE DIDI,
CRIADOR DE LINGUAGEM COM RAÍZES AFRICANAS

O artista plástico, escritor, ensaísta e líder espiritual Deoscóredes Maximiliano dos Santos, popularmente conhecido como Mestre Didi, morreu em Salvador aos 95 anos. Ele foi enterrado neste domingo (6), por volta das 17h, no cemitério Jardim da Saudade, no centro da capital baiana.
O artista era famoso por representar elementos da cultura afro-brasileira em suas obras, como os orixás e os exus, temas recorrentes de suas esculturas.
Além das capacidades de escultor, Mestre Didi também era conhecido por liderar a comunidade espiritual nagô. Ele era filho de Maria Bibiana do Espírito Santo, também chamada de Mãe Senhora, uma das principais mães de santo do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, de Salvador. Em 1985, ele recebeu o título de alaipini, título máximo da hierarquia sacerdotal nagô.

Mestre Didi não costumava falar sobre sua obra nem sobre si próprio. Ele chegou a expor em Gana, Senegal, Inglaterra e França, além do Guggenheim, em Nova York. No Brasil, ganhou reconhecimento após a 23.ª Bienal de São Paulo, em 1996, quando recebeu uma sala apenas para suas obras.
Era casado com a antropóloga Juana Elbein dos Santos, que o definia como um "sacerdote-artista", expressando por meio da arte sua cultura, intimamente ligada às tradições africanas. Deixa a filha, a cantora Inaicyra Falcão dos Santos.
"Estive com o Mestre Didi há três dias, ele estava acamado. Ele foi um personagem importante na Bahia, um catalisador do culto aos ancestrais, sendo filho de uma das maiores ialorixás da Bahia, a Mãe Senhora. Era um homem de grande interesse nesse universo afro-brasileiro. Foi um homem extraordinário. É uma perda irreparável, porque sem ele a religião afro-brasileira fica mais empobrecida. Como artista, ele foi muito longe, participou até da mostra 'Magiciens de la Terre', no Pompidou. Ele ganhou prestígio nacional com suas obras. Temos 40 obras dele no acervo do Museu Afro Brasil e pretendo fazer uma grande mostra em homenagem a ele. Ele foi o princípio de uma nova linguagem brasileira com profundas raízes africanas", disse Emanoel Araujo, diretor do Museu Afro Brasil.