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sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

 

O Pequeno Franzino Lua

                    Cyro de Mattos

 

O futebol de Itabuna, digno de seu passado amador brilhante, quando era vencedor constante, dava orgulho à cidade. De uns tempos para cá se tornara em grande frustração, abatendo o torcedor de gerações passadas, acostumado a comparecer ao velho Campo da Desportiva para torcer com entusiasmo pelo seu time do coração. A frustração que esse torcedor saudoso carrega dentro dele hoje força que acenda o coração no sentimento de amor e saudade. De grandeza, autoestima. Lembre-se do tempo em que esse futebol amador foi pródigo em oferecer partidas memoráveis, portadoras da verdade como reflexo da vida, dizendo que nela existe a alegria dos que vencem, a tristeza dos que perdem, conformismo ou não dos que empatam em cada batalha.

           Eram    quatro irmãos, quatro craques do nosso futebol amador. Os quatro irmãos Riela formaram um capítulo à parte nas partidas disputadas no Campo da Desportiva. Eram conhecidos como os quatro mosqueteiros do rei, pois constante era o sentimento de união entre eles no relacionamento com a vida. Fernando, Carlos, Leto e Lua eram inseparáveis. A separação somente acontecia quando iam defender as cores de seu clube. Carlos e Fernando jogaram no Fluminense, Leto no Flamengo e Lua no Janízaros. Quando se enfrentavam, o sentimento de irmandade ficava de lado, cada um dava o melhor para defender o seu time. Os quatro eram jogadores dotados de recursos técnicos invejáveis. Cada um com a sua característica na intimidade com a bola.

Fizeram história no Campo da Desportiva. Fernando como um ponta-esquerda que driblava numa velocidade espantosa, deixava o marcador para trás, batido pelo chão, e o torcedor incrédulo ante a investida impetuosa, fundamental na conclusão da jogada perfeita pela beirada do campo. O meia-direita Carlos tinha boa visão de jogo, não olhava para a bola, de cabeça erguida via o companheiro e o campo para o lançamento preciso. Era um médio armador elegante. Leto jogou no Flamengo e se sagrou campeão pela seleção de Itabuna, médio-esquerdo implacável na marcação, com uma eficiência exemplar anulava o ponta-direita, que pouco pegava na bola durante os lances acirrados da partida.

         Lua, o mais novo, era dos quatro o que mais encantava, fazia o torcedor ficar com a boca larga, de tanto que sorria com os seus dribles desconcertantes.  Parecia flutuar em campo na condução da bola, um pássaro que se desvencilhava do obstáculo e no chão voava?  Gingava, driblava, enganava, aquele jogador franzino transvestido em um artista que desenhava a jogada como num sonho. Fazia a tabelinha com o companheiro, deslizava, bailarino ou vento ligeiro que fazia o espetáculo pontilhado de riso e gozo?

         Os admiradores de Lua não cansavam de dizer que dos irmãos Riela ele era o melhor, o que tinha mais recursos técnicos, o pequeno maior. Jogou no Janízaros e na seleção amadora de Itabuna quando esta começou o declínio para não mais conquistar o Intermunicipal. O seu futebol era de tão boa qualidade que foi aproveitado no time profissional do Itabuna. Tinha recursos para jogar em qualquer time grande do Rio ou São Paulo. Se fosse hoje, não tenho dúvida, melhor preparado fisicamente, estaria atuando até em equipes europeias de ponta. Por que não? Quem viu, sabe do que estou falando, não me deixa mentir.

          Aquele jogador franzino, travesso em cada drible que dava, deixou-nos há pouco, está em outras dimensões fazendo os anjos não parar de sorrir com os seus dribles cheios de molecagem.  

 

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

 



 
No Brasil o "I Seminário Edivaldo M. Boaventura"- Academia Baiana de Educação: homenagem a um imenso educador 

por
Antonella Rita Roscilli


                                                                      

                                                                                                                                                                                  

Muito poderà contar Itália sobre  o prof. Edivaldo M. Boaventura quem està escrevendo estas páginas, e que teve o imenso privilegio de conhecer este grande educador, sempre acompanhado por uma humanidade e gentileza impar junto à sua esposa Solange. Tive a honra de ter ele como orador durante a minha posse em 2012 como membro correspondente pela Italia na ALB. Me convidou para escrever o prefacio da obra dele "Viagens a caminho do saber" (Quarteto ed.), com a bela capa criada por Daniel Boaventura.

Com ele promovemos em 2017 no IGHB-Instituto Geográfico Histórico da Bahia o seminário “O Príncipe italiano Umberto di Savoia e a sua passagem na Bahia em 1924” e foi uma grande alegria ter ele na mesa com um texto belissimo, junto ao ex Governador Roberto Santos, filho do Reitor Edgar Santos que tanto fez para desenvolver a Universidade Federal da Bahia. E ainda, ter a honra de ter ele como colaborador desta Revista italiana "Sarapegbe", com artigos brilhantes. Guardo na minha estante suas  preciosas obras.
 
A "Academia Baiana de Educação" organiza para o dia 10 de dezembro o I Seminario Edivaldo M. Boaventura, um webinario que visa comemorar os 87 anos de nascimento de Edivaldo M. Boaventura (Feira de Santana, 10 de dezembro 1933- Salvador, 22 de agosto de 2018), uma das mais notáveis personalidades do cenário cultural e educacional baiano e brasileiro contemporâneo, e que deixou um conjunto de obras e ações de valor incomensurável para o estado da Bahia e o Brasil inteiro. Profissional dedicado, acreditava firme na Educação como fator de desenvolvimento e a isso dedicou a própria vida, com alta competência e coerência e humildade.
 
O Seminário, organizado por Alfredo Matta  teve como anfitrião Astor de Castro Pessoa, Presidente da Academia Baiana de Educação, e como conferencistas professores e intelectuais de alto nível profissional como Antonietta Nunes, Dom Emanuel Amaral, Adriano Eysen, Leda Jesuino, Lidia Pimenta, Adriano Matta, Francisca de Paula, e do Portugal Miguel Monteiro.  Durante o evento foi lançado o Memorial virtual e houve o pré-lançamento do livro "A criação da UNEB: Percursos de Edivaldo Boaventura" (ed. Mondrongo), Adriano Eysen, Bruno Lopes Do Rosario e Lidia Boaventura Pimenta (organizadores).
 
                                                                   
Professor e educador, Edivaldo M. Boaventura contribuiu na formação de professores e de profissionais, e orientou milhares de estudantes até o fim da sua vida. Entre as suas múltiplas atividades, foi escritor, diretor-geral do Jornal A Tarde, ocupou a cadeira 39 da Academia de Letras da Bahia-ALB desde 1971, foi Presidente da ALB quando foram reorganizados o site na Internet, o Arquivo e a Biblioteca da ALB, re-inaugurada por ele no dia 10 de agosto de 2012 e intitulada a Jorge Amado.
 
Exerceu funções de importância e destaque na sociedade baiana, como secretário de Educação e Cultura da Bahia, além de ser fundador e primeiro Reitor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) com seus muitos Campus que difundiram a UNEB em vários lugares e cidades do interior da Bahia, assim possibilitando aos jovens o direito de acesso à educação academica publica, de qualidade e inclusiva, a sem  eles terem mais a obrigação de deixar a própria cidade para poder continuar com os estudos. Era Membro da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia, membro da Academia Brasileira de Educação, Membro e Orador Oficial do IGHB, fundador da Faculdade de Educação da Ufba e Academia de Ciências da Bahia.
 
Foi pioneiro na introdução dos estudos africanos na educação. Em "A construção da universidade baiana: origens, missões e afrodescendência"(ed. Edufba), na página 215 Edivaldo M. Boaventura escreve: "A educação estaria comprometida se não estivesse assentada na realidade histórico-cultural da sociedade a que se destina. Firmada nesta convicção, a Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia, gestão 1983-1987, instituiu a disciplina Introdução aos Estudos Africanos, precedida do Curso de Especialização em Estudos da História e das Culturas Africanas para habilitar docentes no ensino dessa matéria. Desenvolvemos uma iniciativa pioneira e condizente com as tradições afrobaianas." 

Entre as muitas e ilustres atividades, não podemos esquecer a criação do primeiro parque na Bahia, o Parque Castro Alves, em Muritiba, na Fazenda Cabaceiras, onde o poeta Castro Alves nasceu, a cerca de 150 quilômetros de Salvador. "Hildérico Pinheiro de Oliveiro trabalhara com Anísio Teixeira, e foi fundamental nesse projeto. Pedro Calmon também desenhou o que imaginava. O parque acabou saindo no segundo semestre de 1970. Deixamos a localidade com quatro salas de aula, então o curso primário completo" disse uma vez. E depois criou um outro, o importante e belo Parque de Canudos. 
 
No Jornal A Tarde, Edivaldo Boaventura assumiu o cargo de diretor-geral em 1996. Durante a gestão, ele deu especial atenção ao projeto A Tarde Educaçãoinserindo o jornal nas escolas do interior da Bahia. Orgulhoso Cidadão de Feira de Santana era membro da Academia Feirense de Letras. Apaixonado estimador do Portugal, foi condecorado pelo governo de Portugal com a Ordem da Instrução Pública no grau de Comendador, pelos serviços prestados à educação e cultura nos dois países de língua portuguesa.
 
Educador e trabalhador incansável e visionario, jà há muito tempo ele estava convencido de que a educação a distância é um fator fundamental, ao atingir áreas e pessoas muito distantes dos grandes centros deste país continental e do estado da Bahia, que tem mais de 560 mil quilômetros quadrados. "Temos que ser pelas aprendizagens híbridas, a presencial e aquela a distância; as duas modalidades devem se complementar" dizia.
Edivaldo M. Boaventura permanece um farol de Luz e viverà para sempre através seus livros que continuam ajudando milhares de estudantes e estudiosos.
 

Antonella Rita Roscilli. Lusitanista, jornalista, escritora e tradutora. Formada na Itália em Língua e Literatura do Brasil e dos países africanos de língua oficial portuguesa, trabalhou por muitos anos na emissora publica  RAI-Radiotelevisione Italiana. Se ocupa de temáticas interculturais e comunicação. No Brasil faz parte da Academia de Letras da Bahia e do Instituto Geográfico Histórico (IGHB), eleita Membro Correspondente pela Itália. No Brasil està vinculada à UFBA e è pesquisadora do CNPq.  Como biógrafa da memorialista Zélia Gattai, esposa do escritor Jorge Amado, publicou no Brasil obras quais Zélia de Euá Rodeada de Estrelas (ed. Casa de Palavras), Da palavra à imagem em “Anarquistas, graças a Deus” e Zélia Gattai e a Emigração italiana no Brasil entre Séc. XIX e XX com a Edufba, editora da Universidade Federal da Bahia. 

 

OS 100 ANOS DE NASCIMENTO DE CLARICE LISPECTOR

 

Ricardo Cravo Albin

 

Nesta quinta feira a literatura está em festas. A celebração dos 100 anos de Clarice Lispector representa mais, muito mais, para o fazer literário, o escrito na língua portuguesa, do que pode avaliar nossa apelidada “vã consciência”.

 

Clarice, que se intitulava mais uma jornalista do que escritora, errou em sua auto avaliação. Porque tudo que fez manejando palavras e o estímulo do intelecto em forma de arte ficou revestido de um grau superior e universal.

 

Por essa razão, acode-me a memória das muitas conversas que mantínhamos dentro do Conselho de Literatura do Museu da Imagem e do Som, de que ela participava a meu convite tanto na busca dos nomes para os depoimentos destinados à posteridade quanto para escolha dos prêmios Golfinho de Ouro e Estácio de Sá, os melhores do ano em literatura. Ao final da tarde, o Conselho de Literatura já encerrado, eu levava Clarice ao seu apartamento no Leme, na Gustavo Sampaio.

 

Evoco essa memória de amizade e admiração porque já naquela época muitos críticos intuíam dentro e fora do Conselho que caberia à Clarice uma consagração internacional. Sua literatura absolutamente original para a época estimulava o futuro, projetava audácia, arquitetava beleza e surpresa.

 

Seguem abaixo, tanto como farei amanhã com seu vizinho de data de aniversário, Noel Rosa, algumas frases que definem a essência do seu pensamento provocador.

 

1- “Não entendo, apenas sinto. Tenho medo de um dia entender e deixar de sentir.”

2- “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.”

3- “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.”

4- “Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome.”

5- “O amor já está, está sempre. Falta apenas o golpe da graça - que se chama paixão.”

6- “Mas há a vida que é para ser intensamente vivida. Há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata.”

7- “Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, Depende de quando e como você me vê passar.”

8- “Que minha solidão me sirva de companhia. Que eu tenha a coragem de me enfrentar. Que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”

9- “Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato... Ou toca, ou não toca.”

10- “E se me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar.”

11- “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.”

12- “Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam.”

 

Como fiz questão de que o Pen Clube Internacional do Brasil a homenageasse, repito aqui a frase que encimou toda a correspondência do nosso Organismo Internacional.

 

2020 – ANO DOS 100 ANOS DE CLARICE LISPECTOR

 

·      Ricardo Cravo Albin é presidente do Pen Clube do Brasil.

 

 

OS 100 ANOS DE NASCIMENTO DE CLARICE LISPECTOR

 

                          Ricardo Cravo Albin

 

Nesta quinta feira a literatura está em festas. A celebração dos 100 anos de Clarice Lispector representa mais, muito mais, para o fazer literário, o escrito na língua portuguesa, do que pode avaliar nossa apelidada “vã consciência”.

 

Clarice, que se intitulava mais uma jornalista do que escritora, errou em sua auto avaliação. Porque tudo que fez manejando palavras e o estímulo do intelecto em forma de arte ficou revestido de um grau superior e universal.

 

Por essa razão, acode-me a memória das muitas conversas que mantínhamos dentro do Conselho de Literatura do Museu da Imagem e do Som, de que ela participava a meu convite tanto na busca dos nomes para os depoimentos destinados à posteridade quanto para escolha dos prêmios Golfinho de Ouro e Estácio de Sá, os melhores do ano em literatura. Ao final da tarde, o Conselho de Literatura já encerrado, eu levava Clarice ao seu apartamento no Leme, na Gustavo Sampaio.

 

Evoco essa memória de amizade e admiração porque já naquela época muitos críticos intuíam dentro e fora do Conselho que caberia à Clarice uma consagração internacional. Sua literatura absolutamente original para a época estimulava o futuro, projetava audácia, arquitetava beleza e surpresa.

 

Seguem abaixo, tanto como farei amanhã com seu vizinho de data de aniversário, Noel Rosa, algumas frases que definem a essência do seu pensamento provocador.

 

1- “Não entendo, apenas sinto. Tenho medo de um dia entender e deixar de sentir.”

2- “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.”

3- “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.”

4- “Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome.”

5- “O amor já está, está sempre. Falta apenas o golpe da graça - que se chama paixão.”

6- “Mas há a vida que é para ser intensamente vivida. Há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata.”

7- “Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, Depende de quando e como você me vê passar.”

8- “Que minha solidão me sirva de companhia. Que eu tenha a coragem de me enfrentar. Que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”

9- “Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato... Ou toca, ou não toca.”

10- “E se me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar.”

11- “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.”

12- “Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam.”

 

Como fiz questão de que o Pen Clube Internacional do Brasil a homenageasse, repito aqui a frase que encimou toda a correspondência do nosso Organismo Internacional.

 

2020 – ANO DOS 100 ANOS DE CLARICE LISPECTOR

 

·      Ricardo Cravo Albin é presidente do Pen Clube do Brasil.