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sábado, 23 de abril de 2016

           



            


     A Morte de Salim Miguel (1924-2016)

Salim Miguel, o escritor mais importante de Santa Catarina em nosso tempo, figura marcante de nossas letras no século XX, autor de A Rede, romance, A Morte do Tenente e Outros Contos,  Velhice e Outros Contos, Nur Na Escuridão, romance, entre outros, com mais de 30 livros publicados, entre volumes de crônicas, contos e romances,  morreu sábado, 22 de abril de 2016, aos 92 anos de idade, em Brasília - DF, onde atualmente residia.
     Um de seus contos, “O Gol”, participa da antologia Contos Brasileiros de Futebol (LGE Editora, Brasília, 2008), organizada por Cyro de Mattos. Nascido no Líbano, mas criado em Santa Catarina, Salim Miguel participou do movimento de renovação cultural de Santa Catarina, conhecido como Grupo Sul. Foi preso durante  o golpe militar de 1964. Transferiu-se para o Rio de Janeiro onde foi um dos redatores da revista “Ficção”. De volta a Florianópolis dirigiu  a editora da Universidade Federal  de Santa Catarina, de 1983 a  a 1991.  Com Nur na Escuridão ganhou o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes e Prêmio Zaffari &Bourbon. A Academia Brasileira de Letras agraciou Salim Miguel com o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra.
Segue abaixo depoimento do autor de Velhice e Outros Contos.
"Comecei a escrever antes de aprender a escrever. Naquela época, fim dos anos 20, começo dos 30, depois das estripulias diárias, a criançada se reunia ora na frente da casa de um, ora na frente da casa de outro, e cada um relatava como é que tinha sido o seu dia. As correrias, as brigas. Hoje, nós brigávamos; amanhã, éramos grandes amigos. Então, eu cortava uma folha de papel-embrulho da loja de meu pai, recortava palavras ou letras, juntava alguns rascunhos meus. Linhas na horizontal, na vertical, em círculos. E lia aquilo pra eles. Lia não, porque eu não sabia ler. Inventava que estava lendo. Ali estava surgindo, ao mesmo tempo, o jornalista e o escritor. Então meu pai, me vendo grudado em tudo que era papel impresso, vendo aqueles signos mágicos me fascinarem, me perguntou: “O que pretendes fazer na vida?”. Sem titubear, respondi: “Ler e escrever”. Minha mãe, que era uma mulher sensível, disse: “Não vai ser fácil”. E meu pai: “Fácil não vai ser, mas se ele persistir, conseguirá”. Então, uma palavra que me acompanha toda a vida é “persistir.

 Para falar a verdade, se eu tivesse uma formação acadêmica, gostaria de ter sido crítico e ensaísta. João Cabral dizia a mesma coisa. Mas acho que tive o bom senso de sempre escrever muito e rasgar mais do que publiquei. Rasguei muito mais do que publiquei. Tanto que, para os nossos padrões, pelo menos para os da minha juventude, comecei muito tarde. Passei a infância e a adolescência em Biguaçu — tanto que costumo dizer que sou um líbano-biguaçuense — e só comecei a publicar em Florianópolis. Nos anos 40, a capital catarinense tinha quatro jornais. Hoje, só tem um. (…) Ao mesmo tempo em que eu publicava algumas crônicas nos jornais, já começava a escrever o que chamo de “anotações sobre leituras”. De repente, me disse assim: “Já que estou fazendo crônicas — e a crônica é meio caminho para o conto —, por que não chego ao conto?”. Daí, comecei a publicar contos. Meu primeiro livro é de 1951. Chama-se Velhice e outros contos, pois sempre me preocupou o tema da velhice, da morte, do tempo e da memória. Devo esse livro ao IBGE. Não ganhei dinheiro trabalhando para o senso demográfico de 1950, mas cinco dos oito contos desse livro, inclusive os três Velhice — Velhice 1Velhice 2Velhice 3 —, resultaram de conversas com pessoas que fui recensear."

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