Marido e Mulher
Cyro de Mattos
Ele era alto, forte, ela tinha a estatura
baixa, cintura grossa. Ela ainda não
havia se acostumado com a vida de casada. Andava desconfiada pelos poucos cômodos da
casa. Quando o gato derrubava uma panela, ela tomava um susto medonho. Se
soltava um miado linguarudo, ela achava estranho, irritava-se. O marido falava alto
quando se dirigia a ela. Não gostava. Chamava a atenção dele, tivesse modos,
respeitasse sua mulher, que exigia tratamento digno, se quisesse ter esposa sempre,
falasse com ela mais baixo.
Era a primeira vez que havia saído da casa
dos pais. Lá é que era bom, tudo era paz e conforto. Não havia briga entre o pai
e a mãe. Não existia preocupação, a mãe cuidava de tudo. Arrumava a casa, fazia
a comida e ainda cantarolava.
Agora ele deu na refeição matinal para
beber o café fazendo um ruído horrível pela boca, sem dois dentes na frente.
Pare com isso – dizia.
- Por quê? – ele perguntava.
- Por que não gosto – respondia de pronto.
- Mais essa! – e vinha a desforra: - Os
incomodados que se mudem.
- Não vejo essa hora – respondia com o
nariz empinado.
Ele continuou a beber o café com aquele
ruido horrível pela boca.
Ela reclamava, “pare com isso, me
respeite!”
Ele não se importava.
- Me respeite, sou uma moça de família,
não vim para sentar à mesa e ser desrespeitada – ela reclamava.
A hora mais prazerosa para ele era quando
começava a beber o café soltando o ruído costumeiro pela boca.
Ela, enervada, ameaçava:
- Você me respeite, não me casei pra
engolir esse tipo de afronta.
Ele não ligava.
Até que um dia, apanhou uma faca e correu
para cima dele.
- Agora, sujeito desgraçado, vou furar seu
bucho, cortar sua garganta e acabar de uma vez com essa pirraça desgraçada.
Ele não titubeou, viu que ela não estava
brincando, o rosto avermelhado, a boca tremia de raiva.
Saiu correndo na direção da porta. Desceu a escada depressa.
Lá embaixo soltou um grito de guerra, que
abalou a casa.
- Já que você não me suporta, fique aí sozinha
na sua gaiola.
Implorou à mãe que trouxesse ele de volta.
De agora em diante estava resolvida a tolerar a situação que lhe era deplorável,
feria e doía um bocado.
Ele voltou, com uma condição, que jamais
ela desaprovasse sua conduta na refeição matinal quando fosse beber seu café. Era a mesma condição que uma sentença ordenava
para resolver o impasse e pendia para uma das partes. Proferida pelo juiz de
direito, não admitia recurso contra, no caso ele era o autor triunfante. O
litígio estava encerrado, definitivamente com o trânsito passado em julgado.
O sorriso contente, ele retornava como o vencedor
da causa. Cheio de gosto bebia seu café, fazendo o ruído na boca. Dava um
prazer danado quando como um ralo os lábios sorviam seu gostoso café, era
imbatível quando fazia o barulho na boca. Ela agora achava graça.
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