A Única Briga
Crônica de Cyro de Mattos
Só brigou uma vez no
internato. Foi com um menino que jogava de ponta-esquerda no time de camisa
branca. Jogando como lateral direito no time de camisa azul, ele dava uma marcação implacável àquele
menino troncudo, baixo, braços musculosos.
Em compensação era menor do que ele, que sempre se antecipava para tomar
a bola dele, um atacante arisco, bom no
drible curto, precisando ser marcado de perto.
Era um duelo à parte entre os dois quando o
time de camisa azul enfrentava o de camisa branca.
Na última partida, o
marcador e o atacante chocaram-se na
grande área, temeu-se que os dois contendores tivessem se machucado gravemente.
Houve bate-boca, dedo em riste no rosto, da próxima vez eu lhe quebro a canela,
jogadores dos dois times apartaram os dois para evitar a briga. Terminado o
jogo, atracaram-se e a briga não continuou porque o Irmão Já-Morreu trilou o
apito várias vezes, pedindo a seguir que
os dois rivais lhe acompanhassem.
Adiante, no campo
vazio, ao lado da parede alta atrás de um dos pavilhões do colégio, o Irmão
ordenou:
- Agora podem brigar à
vontade. Ninguém vai apartar.
Brigaram mais de uma
hora. Nos lances com murros desfechados um ao outro, ele procurava evitar que o
rival agarrasse o seu corpo. Se tal acontecesse, seria derrubado, e, no chão,
dominado, massacrado, não teria
a mínima chance para vencer a briga.
A certa altura do
duelo, os brigões mostravam cansaço, mas nenhum deles recuava, não pensava em correr. O irmão mais velho disse para ele que, se um
dia brigasse com um dos meninos internos, fosse até o fim, nunca corresse.
Tomasse pancada, mas agüentasse, mesmo que tivesse de ser o perdedor. Quem corria em qualquer briga, era
chamado de frouxo, ficava sem merecer o respeito dos outros.
Exatamente o que ele
fez, retirou forças de onde não mais existia,
e, com as recomendações do irmão na cabeça, desferiu uma saraivada de golpes na barriga do menino
troncudo, que não resistiu, rodopiou e caiu, gemendo.
O rosto inchado, corte
na boca e no supercílio. Apresentou-se com o rival ao Irmão Já-Morreu, que ordenou, vão tomar banho e mudar de roupa, depois desçam para o refeitório. Aconteceu depois que o derrotado na briga ficou proibido de sair do internato
quatro domingos, o mesmo castigo foi
dado a ele.
O tempo que ficou no
internato, o menino troncudo evitou falar com ele. Passava de cara
enfezada quando o encontrava
em qualquer lugar do colégio. Ao contrário, ele não guardou raiva do seu adversário, até estava disposto a
fazer as pazes com ele, deixando a rivalidade para dentro do campo quando
o time de camisa azul fosse jogar mais
uma partida contra o de camisa branca.
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