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sexta-feira, 13 de outubro de 2017

              


                  Romance  da Infância 
          
                  Cyro de Mattos

Já vai longe o tempo da infância na cidade onde nasci. Tinha poucas ruas calçadas,  três ou quatro bairros, o jardim, o cinema, o ginásio e a igrejinha. Seu rio, chamado  Cachoeira, descia sereno no tempo de estio. Era brabo na cheia, derrubava as casas ribeirinhas,  alagava ruas, levava no lombo  até bicho grande morto. Dividia a cidade em duas partes. Uma gente pobre tirava dele o sustento de suas famílias: lavadeiras, tiradores de areia,  pescadores e aguadeiros.
Lá, naquela cidade distante,  joguei bola com a turma de queridos amigos nos campinhos improvisados dos terrenos baldios.  Roubei fruta madura nos quintais das casas perto da beira do rio.  Brinquei de mocinho e bandido. Fiz a primeira comunhão e tive a primeira namorada. Esbanjei alegria no meu primeiro carnaval pelo salão do clube social. 
Lá também criei vaga-lumes para vê-los à noite piscando no quarto. Nadei como um peixe ágil nos poços bem claros do rio que tinha as águas doces. Andei como um bicho solto, sem ter medo  de nada, nos caminhos do mato. Feito pássaro dava cada voo com o vento mais alto. Quando cresci, soube que  a infância tem um sabor de fruta doce  que acaba quando chega o tempo dos homens.
              Não querendo que aqueles dias vividos com aventuras, descobertas e sustos esplêndidos se perdessem no tempo que se foi, sem que eu percebesse de tão rápido, ficando na alma trancados pelos homens,  resolvi então escrever algumas breves ficções com pedaços da infância. Nesses episódios que reinventei  com os fios eternos do sonho, procuro   compartilhar com quem quiser ler  um pouco da aventura da vida. Percorro caminhos,  para encontrar o menino na fumaça do tempo, mas que ainda pulsa no meu coração porque não se cansou de ser menino. Assim, anuncio que acabo de escrever meu segundo romance, Nada Era Melhor, que se destina ao leitor iniciante, mas também adulto. .
Cada  episódio desse romance  pode ser concebido como uma história, já que  possui autonomia na sua narrativa, conduzida na trama  com  os elementos tradicionais do tempo desmembrado com princípio, meio e fim. Como cada um dos episódios  é protagonizado por um menino em sua pré-adolescência, tendo como espaço de  suas aventuras  a infância,  o lugar onde elas acontecem sendo  uma cidade do interior baiano, no caso a cidade onde nasci, na primeira  metade do século XX, com personagens secundárias que  participam algumas vezes de muitos eventos,  não se pode deixar de considerar que Nada Era Melhor é uma história representativa da primeira fase da vida. Um romance,  de iniciação, como alguns escritores já fizeram na literatura ocidental.  E de maneira fascinante.
Mas aviso aos navegantes da barca literária que longe de mim a  pretensão de querer ser um  desses admiráveis ficcionistas, tecedores  da infância  com pedaços coloridos duma aventura inocente e vibrante.  Estaria realizado como autor se, por exemplo,  tivesse assinado Menino de Engenho, de José Lins do Rego, ou  Menino no Espelho, de Fernando Sabino.


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