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terça-feira, 19 de outubro de 2021

 

Luta, revolta e poesia em Os Ventos Gemedores

 

Raquel Rocha

 

O livro Os Ventos Gemedores, do escritor Cyro de Mattos, que ganhou o Prêmio Nacional de Ficção do Pen Clube do Brasil, relembra um Brasil de outrora, que de alguma forma ainda é o mesmo Brasil. Porque os tempos mudam, as armas mudam, as guerras mudam, mas os anseios e a ganância dos homens continuam os mesmos.

 

O livro é ambientado nas terras do Pati, pertencente ao território do Japará, condado criado pelo imaginário do autor, com todas as cenas, movimentos e personagens rústicas, mas que lembra o Sul da Bahia, na época de coronéis, jagunços, mata fechada, miséria e opressão. Nesta terra sem lei nos deparamos com o Vulcano Brás, senhor de todas as terras, e o vaqueiro Genaro que decide ir de encontro ao dono de tudo.  Uma luta entre as gentes de Vulcano Brás com seus cabras e os que trabalham na terra em regime de escravidão  é estabelecida numa demanda  em que o mais forte sempre venceu.

 

O mergulho psicológico que Cyro de Mattos faz nos seus personagens nos envolve na leitura: o conformismo de uns, a inocência de outros, a coragem de muitos.

 

Em um belíssimo trecho dessa obra conhecemos os medos de Almira e a revolta do seu esposo Genaro: “Que adianta fazer esta revolta, Genaro? O lado de Vulcano Brás sempre foi mais forte”. Ele responde “A pior derrota é daquele que não luta”, acrescentando que “onde ninguém faz nada contra Vulcano Brás só a vontade dele é a única que impera, e os que se agacham permanecem assim mesmo o tempo inteiro, trabalhando, trabalhando, sem nunca ter nada na vida”.

 

Aparício Pança Farta vai de encontro à violência que se espalha no povoado: “Cada um nesse mundo cumpre sua sina. (...) Liberdade ganha com sangue não tem presteza.”, ele diz.

 

Na nona parte do livro, “Ultimas Ordens”, Cyro da Mattos revela o desejo do poderoso Vulcano Brás quando vê que lhe resta pouco tempo de vida, o de atingir a imortalidade de seu nome e de sua história: “As dores no peito aumentaram no último ano de sua vida. Numa dessas crises ele chamou Edivina e falou que queria ser enterrado no cemitério da Vila do Pati. Cuidassem de colocar na sepultura o seu busto para que todos se lembrassem dele, comentassem sobre suas andanças e audácias pelas terras do Japará. Morre o homem fica a fama. Era assim que se imaginava depois de morto, admirado em razão dos amplos domínios conquistados, coragem e pulso forte.”

 

O livro todo tem essa linguagem poética que é uma marca do escritor Cyro de Mattos.

Ele nasceu  no município de Itabuna, no Sul da Bahia, em 31 de janeiro de 1939. Jornalista, poeta, romancista, contista, novelista, cronista, ensaísta, autor de livros infantojuvenis. Diplomou-se em Direito pela Universidade Federal da Bahia, em 1962. Dentre seus 80 livros publicados, destacam-se: Os Brabos, O Menino Camelô, Cancioneiro do Cacau, Os Ventos Gemedores e Vinte Poemas do Rio. Seus livros são estudados em universidade, adotado nas escolas brasileiras e sofre reedições constantes. Vários deles foram adquiridos pelos programas educacionais do Governo. É também editado em Portugal, Itália, França, Espanha, Alemanha e Dinamarca. Premiado no Brasil, Portugal, Itália e México.  

 

 

 

 

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