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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

 

                 A História de Chapinha

                          Cyro de Mattos

 

Quando escrevi O Menino e o Trio Elétrico não sabia que pela primeira vez abordava na literatura infantil brasileira o tema que trata do carnaval baiano com seus famosos trios elétricos, que virou há tempos coisa para turista e rico, e dos que não podem participar da festa.   Queria apenas escrever sobre um menino pobre como Chapinha, com o seu sonho como algo quase impossível de se realizar, porque um abadá a vestimenta que identifica um bloco, chega a custar muito dinheiro.

            Nem sabia que na história de Chapinha e o trio elétrico caberiam “todos os cheiros de Salvador, com suas ladeiras e becos, santos e orixás, alegria de seu povo no agito de uma festa que faz a cidade trepidar por todos os cantos”, como comentou a escritora Helena Parente Cunha. Foi a professora doutora Normeide Silva Rios que me chamou a atenção sobre esse aspecto inovador da história de Chapinha quanto ao assunto enfocado. Ela ressalta: “Convém registrar o caráter inovador do livro O Menino e o Trio Elétrico, de Cyro de Mattos, por ser o primeiro na literatura infantojuvenil baiana a apresentar como protagonista um garoto pobre da cidade grande e tematizar as desigualdades presentes na realidade social da capital baiana, evidenciando-as.”

          Acresce ao seu estudo publicado no livro Os Caminhos da Literatura Infantojuvenil Baiana, EDUFBA, Editora da Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012, o texto   Carnaval e Literatura, de Elias José, publicado primeiro no Suplemento de Minas Gerais. O consagrado autor de livros infantis destaca o carnaval como tema na história de Chapinha e mais, a de um menino pobre e preto que vende amendoim nas ruas de Salvador para sobreviver. Isso pouco ocorria na literatura infantil brasileira, o assunto do menino pobre no seu trabalho diário como tema de uma história.

Distinguido com o Prêmio Maria Alice de Lucas, da União Brasileira de Escritores (RJ, 2008), a história de Chapinha fez leitores nas escolas brasileiras. Foi traduzido pela poeta Mirela Abriani e publicado na Itália pela editora Romar, de Milão.  Mostrava-me mais uma vez como a literatura gostava de operar milagres. Para que tudo isso acontecesse, como foi que surgiu o motivo para que escrevesse a história de Chapinha e o trio elétrico? Uma atraente história infantil na opinião do tradutor Fred Ellison, professor emérito da Universidade de Austin, nos Estados Unidos.

Ele observou: “Vejo refletido neste livrinho para crianças (e adultos) muitas das melhores qualidades de sua arte. Especialmente aquela paixão pela rica cultura nordestina (principalmente a baiana). O Menino e o Trio Elétrico é um vasto tesouro acerca da vida nas ruas da cidade de Salvador. O trio elétrico torna-se um foco ideal para a exibição desse tesouro. Nós não temos nada igual a isso.”

       Conto agora como fui motivado para escrever a história.

      “Certa vez eu estava dando um passeio pela orla de Salvador quando vi um menino negro entrar no ônibus para vender amendoim torrado aos passageiros. A festa do carnaval ia acontecer dali a uma semana. Ia mexer, como sempre, na “alma” da cidade de todos os santos e orixás, transformando-a numa onda de alegria, feita de ritmos e cores vibrantes, com os foliões pulando, cantando, abraçando e beijando... na maior felicidade...

“Ao retornar ao hotel à noite, imaginei como seria a vida daquele menino durante o carnaval, vendendo amendoim enquanto a cidade se divertia. Foi assim que começou a nascer esta história dentro de mim. Não vou contar se a história de Chapinha termina com a vitória da tristeza e a derrota da alegria. Bem, isso eu deixo para você ler e sentir comigo todos os lances marcantes do primeiro livro que escrevi para meninos de todas as idades, ambientado na cidade de Salvador, Bahia, com seus dias embalados na folia.”

          Não preciso dizer que amo a literatura, ela tem mostrado que gosta de mim.

 

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