A
História de Chapinha
Cyro de Mattos
Quando escrevi O Menino e o Trio Elétrico
não sabia que pela primeira vez abordava na literatura infantil brasileira o
tema que trata do carnaval baiano com seus famosos trios elétricos, que virou
há tempos coisa para turista e rico, e dos que não podem participar da
festa. Queria apenas escrever sobre um
menino pobre como Chapinha, com o seu sonho como algo quase impossível de se
realizar, porque um abadá a vestimenta que identifica um bloco, chega a custar
muito dinheiro.
Nem
sabia que na história de Chapinha e o trio elétrico caberiam “todos os cheiros
de Salvador, com suas ladeiras e becos, santos e orixás, alegria de seu povo no
agito de uma festa que faz a cidade trepidar por todos os cantos”, como
comentou a escritora Helena Parente Cunha. Foi a professora doutora Normeide
Silva Rios que me chamou a atenção sobre esse aspecto inovador da história de
Chapinha quanto ao assunto enfocado. Ela ressalta: “Convém registrar o caráter
inovador do livro O Menino e o Trio Elétrico, de Cyro de Mattos, por ser o
primeiro na literatura infantojuvenil baiana a apresentar como protagonista um
garoto pobre da cidade grande e tematizar as desigualdades presentes na realidade
social da capital baiana, evidenciando-as.”
Acresce ao seu estudo publicado no
livro Os Caminhos da Literatura Infantojuvenil Baiana, EDUFBA, Editora da
Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012, o texto Carnaval e Literatura, de Elias José,
publicado primeiro no Suplemento de Minas Gerais. O consagrado autor de livros
infantis destaca o carnaval como tema na história de Chapinha e mais, a de um
menino pobre e preto que vende amendoim nas ruas de Salvador para sobreviver.
Isso pouco ocorria na literatura infantil brasileira, o assunto do menino pobre
no seu trabalho diário como tema de uma história.
Distinguido com o Prêmio Maria Alice de
Lucas, da União Brasileira de Escritores (RJ, 2008), a história de Chapinha fez
leitores nas escolas brasileiras. Foi traduzido pela poeta Mirela Abriani e
publicado na Itália pela editora Romar, de Milão. Mostrava-me mais uma vez como a literatura
gostava de operar milagres. Para que tudo isso acontecesse, como foi que surgiu
o motivo para que escrevesse a história de Chapinha e o trio elétrico? Uma
atraente história infantil na opinião do tradutor Fred Ellison, professor
emérito da Universidade de Austin, nos Estados Unidos.
Ele observou: “Vejo refletido neste
livrinho para crianças (e adultos) muitas das melhores qualidades de sua arte.
Especialmente aquela paixão pela rica cultura nordestina (principalmente a
baiana). O Menino e o Trio Elétrico é um vasto tesouro acerca da vida nas ruas
da cidade de Salvador. O trio elétrico torna-se um foco ideal para a exibição
desse tesouro. Nós não temos nada igual a isso.”
Conto agora como fui motivado para
escrever a história.
“Certa vez eu estava dando um passeio
pela orla de Salvador quando vi um menino negro entrar no ônibus para vender
amendoim torrado aos passageiros. A festa do carnaval ia acontecer dali a uma
semana. Ia mexer, como sempre, na “alma” da cidade de todos os santos e orixás,
transformando-a numa onda de alegria, feita de ritmos e cores vibrantes, com os
foliões pulando, cantando, abraçando e beijando... na maior felicidade...
“Ao retornar ao hotel à noite, imaginei
como seria a vida daquele menino durante o carnaval, vendendo amendoim enquanto
a cidade se divertia. Foi assim que começou a nascer esta história dentro de
mim. Não vou contar se a história de Chapinha termina com a vitória da tristeza
e a derrota da alegria. Bem, isso eu deixo para você ler e sentir comigo todos
os lances marcantes do primeiro livro que escrevi para meninos de todas as
idades, ambientado na cidade de Salvador, Bahia, com seus dias embalados na
folia.”
Não preciso dizer que amo a
literatura, ela tem mostrado que gosta de mim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário