A
Leitura e o Dilema
Cyro de Mattos
Muito se fala sobre a
questão do número “modesto” de leitores, em contraponto à volumosa quantidade
de livros lançados a cada ano. Certa vez o repórter perguntou se há uma relação
de causa e consequência. Como eu via essa questão. Verdade, escreve-se mais para o menos. Uma
enxurrada de livros me é enviada para que eu dê uma opinião. Dá medo. De boa
qualidade poucos vão ficar, a maioria o tempo leva para a poeira do vento.
Bom lembrar que a literatura não
tinha antes a concorrência de outros meios, como o teatro, o cinema e a
tecnologia de hoje, com a linguagem visual, abrangente e instantânea. O autor
tinha mais prestígio. Nem por isso parece que o livro vá desaparecer em seu
formato físico, onde existe o ser humano está o sonho, a questão e a incerteza,
que a palavra escrita gera. Mudou o suporte. A ferramenta visual da internet,
que tem lá seus vícios e virtudes, agora possibilita nova leitura da vida, às
vezes a narrativa ganha muito mais leitores, não se pode negar isso, às vezes o
que produz é deficiente, celebra besteiras, não vinga. Deixando fora esse tipo
de competição massificada, vê-se que a linguagem da arte é sempre específica e
exige um leitor íntimo dos problemas estéticos, que têm a ver com a
criatividade em si e a recepção do assunto.
Como
solucionar o grande enigma, o nó górdio da leitura no Brasil? É um problema do
País, de educação, econômico e político. É preciso que haja uma postura séria
que ataque as causas do problema. Cabe aos governantes, dirigentes e
administradores fornecer os meios para o enfrentamento dessas causas, de
natureza complexa. Não é impossível de ser pelo menos atenuado. Basta boa
vontade e seriedade. Somos um país de iletrados, sem hábito de leitura, com um
poder aquisitivo baixo pelas classes menos favorecidas. Nesse conjunto de
omissões falta uma política institucional pública eficiente para fornecer
instrumentos com os quais a editora que está nascendo tenha assim algum
suporte, estímulo para sobreviver e crescer.
É preciso também uma
legislação que obrigue as universidades e colégios estudarem o autor no
vestibular e na sala de aula. É preciso criar novas estratégias nos programas
de apoio ao livro e de sua circulação nos espaços de leitura. Como está vamos
continuar na mesmice. Pior ainda com a concorrência do fácil proposto pela tevê
e o vídeo.
Uma questão central da contemporaneidade é
a literatura em tempos de Inteligência Artificial, quando máquinas “pensam” e
produzem textos cada vez mais subjetivos. Qual seria o desafio dos escritores
hoje?
A
Inteligência Artificial não cria significado, só os humanos. É digital, desconhece
as questões interiores e incertezas. O que sabe do amor? Do inexorável? De
Deus? Vê nascer e vê morrer sem nada
poder fazer? Se não tem a razão e a
emoção como pretende enfrentar os atritos do enigma com o seu peso? Tem seus ganhos, utilidade, mas por enquanto
vou ficando no meu canto, escrevendo o meu tanto, com espanto e encanto.
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