Ono no Komachi (por Ogura Hyakuni Isshu) |
Por Cyro de Mattos
Condenados à inutilidade,
os velhos estão sempre pesando. Sofrem rejeição
sob vários aspectos. Saber
que a vaga já está preenchida por outro em razão da idade mais moça,
não é nada agradável.
Não existe imagem única
sobre a velhice. Cada pessoa envelhece como viveu. Existem maneiras de
envelhecer. De todos os males que chegam com a velhice, a falta do que fazer parece ser o
pior, o mais temido
inimigo. Conheci uma criatura que teve de parar de repente, depois de
quarenta anos de atividade ininterrupta. Foi como uma morte. Ficava em estado
lastimável. Vagava pela casa, de péssimo humor, implicante e deprimido. Só
venceu a crise depois que encontrou uma atividade. Mas sabemos que essa alternativa nem sempre ocorre.
Num mundo dirigido e feito
para jovens, onde se vê forte obsessão pela sensualidade,
sendo supervalorizadas a beleza física e a juventude, o que fazer com essa gente velha? Cumprida a
função na família, peso inútil na comunidade,
mais nada a esperar da vida, de repente cada um se vê
sozinho. A família em geral
repugna a solução de um asilo de
velhos, sinônimo de abandono e solidão.
Alguns povos do passado costumavam abandonar
gente idosa da comunidade num lugar deserto. Entre nós, hoje, o que
devemos fazer com os nossos velhinhos?
O ideal
seria a criação de um
centro comunitário, onde eles
se sentissem em
família, tivessem ali
todo o conforto e assistência.
Fosse então erguida a vila, construída
de preferência para o nascente , talvez numa colina onde a vista desse para o mar.
Receberiam o espetáculo do nascer do
sol ou da
lua cheia derramando prata nas
ondas do mar. Não faltariam na
vil a árvores frondosas e frutíferas, passarinhos que em alarido viriam
saudar os hóspedes todas as manhãs. Não poderiam deixar de faltar jardins com
flores. O perfume serviria para suavizar
o coração acordado na lembrança.
A vila
seria um pedaço do
céu. Não haveria lugar para a tristeza, música lá só alegre,
aconselhável que fos¬se entoada pelos
hóspedes. Ninguém teria
vergonha de mostrar o seu talento
nessas horas. Quem soubesse tocar algum instrumento tocava.
Com o maior prazer seriam atendidos os
pedidos de bis que a plateia entusiasmada reclamasse. Quem fosse poeta, querendo declamar seus versos queridos,
declamava.
A v i l a teria quartos
com janelas de claridade e vento amigo. Refeitório amplo, salas de
televisão, para reuniões, capela e um
pequeno teatro. O horário para as re¬feições seria flexível. Os hóspedes seriam
livres para agir como quisessem durante o dia. Quem não quisesse sair, poderia
ficar conversando no papo amigo ou se ocupando em fazer algum trabalho manual
que lhe desse prazer. Os aniversários seriam comemorados como um momento
especial, muito doce, naquele tom afetivo que costuma acontecer em família. A
vida passaria sem que se desse conta, no enlace dos dias com amor. E o que você
e acha desse lugar idealizado assim para esses bons velhinhos seja chamado A
Barca Boa da Felicidade?
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