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segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Os Velhos São Boa Gente

Ono no Komachi (por Ogura Hyakuni Isshu)
Por Cyro de Mattos

Condenados à inutilidade, os velhos estão sempre pesando. Sofrem rejeição  sob vários  aspectos.  Saber  que a vaga já está preenchida por outro em razão da idade mais  moça,  não é nada agradável.

Não existe imagem única sobre a velhice. Cada pessoa envelhece como viveu. Existem maneiras de envelhecer. De todos os males que chegam com a velhice, a falta  do que fazer parece ser  o  pior, o  mais  temido  inimigo. Conheci uma criatura que teve de parar de repente, depois de quarenta anos de atividade ininterrupta. Foi como uma morte. Ficava em estado lastimável. Vagava pela casa, de péssimo humor, implicante e deprimido. Só venceu a crise depois que encontrou uma atividade. Mas sabemos que    essa alternativa nem sempre ocorre.

Num mundo dirigido e  feito  para  jovens,  onde se vê forte obsessão pela sensualidade, sendo supervalorizadas a beleza física e a juventude,  o que fazer com essa gente velha? Cumprida a função na família, peso inútil na comunidade,  mais  nada  a esperar da vida, de  repente cada um  se vê  sozinho. A família  em  geral  repugna  a solução de um asilo de velhos,  sinônimo de abandono e solidão. Alguns povos do passado costumavam abandonar  gente idosa da comunidade num lugar deserto. Entre nós, hoje, o que devemos fazer com os nossos velhinhos?

O  ideal  seria  a  criação de um  centro  comunitário, onde  eles  se  sentissem  em  família,  tivessem  ali  todo  o conforto e assistência. Fosse então erguida a vila,  construída de preferência  para  o nascente , talvez  numa colina onde a vista desse para o mar. Receberiam o espetáculo do nascer do  sol  ou  da  lua  cheia  derramando prata  nas  ondas  do mar. Não   faltariam na  vil a árvores frondosas e frutíferas, passarinhos que em alarido viriam saudar os hóspedes todas as manhãs. Não poderiam deixar de faltar jardins com flores. O perfume  serviria para  suavizar  o  coração acordado  na lembrança.

A  vila  seria um  pedaço  do  céu. Não  haveria  lugar para a tristeza, música lá só alegre, aconselhável que fos¬se  entoada  pelos  hóspedes.  Ninguém  teria  vergonha  de mostrar  o seu talento  nessas horas.  Quem    soubesse tocar algum instrumento tocava. Com o maior prazer seriam atendidos  os pedidos de bis que a plateia entusiasmada reclamasse. Quem fosse poeta,  querendo declamar seus versos queridos, declamava.

A v i l a teria quartos com janelas de claridade e vento amigo. Refeitório amplo, salas de televisão,  para reuniões, capela e um pequeno teatro. O horário para as re¬feições seria flexível. Os hóspedes seriam livres para agir como quisessem durante o dia. Quem não quisesse sair, poderia ficar conversando no papo amigo ou se ocupando em fazer algum trabalho manual que lhe desse prazer. Os aniversários seriam comemorados como um momento especial, muito doce, naquele tom afetivo que costuma acontecer em família. A vida passaria sem que se desse conta, no enlace dos dias com amor. E o que você e acha desse lugar idealizado assim para esses bons velhinhos seja chamado A Barca Boa da Felicidade?


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