Crônica Quase de Amor
Cyro de Mattos
Casou-se
com a moça que ensinava Canto no educandário feminino. Tinha muita crença em
Deus, fazia parte do coro na Catedral de São José, era filha de Maria. Pianista
admirada, compôs o hino da cidade, além
disso escreveu a letra. Havia fundado a escola de música “Som do Sol”
para meninos e jovens carentes,
necessitados de desenvolverem seu pendor para a vida tocada por sons e
pelas cordas. Marília havia sido a sua
primeira namorada quando cursava o segundo
ano no ginásio local. E ele havia sido também o primeiro namorado dela.
Uma moça recatada, filha do maestro da Filarmônica da Euterpe e da
diretora do educandário feminino. No seu retorno à terra natal, encontrou-se
com Marília no salão nobre da sede da Prefeitura Municipal. A cidade
comemorava mais um ano de emancipação política. À noite dançou a valsa na festa que o clube
social dava para homenagear o aniversário da cidade. Reataram o sentimento de amor que ficara adormecido no tempo desde que tiveram o primeiro namoro naqueles idos
adolescentes, quando eram estudantes do
ginásio local.
Havia três anos que vinha exercendo a profissão de advogado com zelo e
dedicação na sua terra natal. Pensou que já era hora de se casar e constituir
uma família. Marília foi a moça eleita
para assumir a condição de esposa, tornar-se
mãe de seus filhos. Não entendia
como uma moça da beleza dela, de boas maneiras, recatada, comportamento
irretocável, não tinha encontrado um parceiro ideal para levá-la ao altar e com a bênção de Deus
fosse selada uma união definitiva.
- É verdade, Marília, que fui o seu
primeiro namorado?
- O primeiro e único.
- Por que ficou tanto tempo sem
namorar algum rapaz da cidade ou
de fora?
- Isso não me incomodava.
- Creio que pretendente não faltou.
- Não, mas recusei as propostas, preferia esperar
por você.
Assim era o destino que em certos momentos somente ele sabe como
engendrar situações no curso do amor. Tantos anos em Salvador, estudando para se tornar um
advogado e, quando pensou no último ano do curso que era chegado o momento de pensar em se
casar com uma moça digna, não
passou pela cabeça em se lembrar de Marília, a primeira namorada que teve na sua
vida, filha da mesma cidade, como
ele. Ela tinha sido apenas um breve momento
de sua vida, como foi a primeira gravata
usada no baile para comemorar a coroação da rainha da primavera no clube
social, e que, pasmem os céus, a eleita
entre os estudantes fora a adolescente
Marilia, sua colega de turma.
Ah, a vida, a vida, ia passando com as suas pegadas ocultas na trama do
amor. Ali estava na sua cidade a moça que
esperava sem pressa para se casar com ele. Tudo estava marcado
para acontecer porque assim é que devia ser.
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