Poemas da Paixão
Cyro de Mattos
Uma
Prece
Bomba
a alvejar manso rebanho,
Fera
branca que se achou Deus,
Cidade
grande em galope amarelo,
Faces
levando sede e fome,
Droga
a matar a maravilha,
Sangue
inocente de réu negro,
Lágrima
extirpada de índio,
Mãos
de metralha do menino,
Pai
que apagou a luz do filho,
Mãe
que não quis sentir a rosa,
Irmão
que fugiu do outro irmão,
Rei
que esqueceu a oração,
Veneno
na água, chão e céu.
Cura-me,
ó Deus de todos os perdões.
Este
Cristo
É
maior que o mundo
Este
andor feito na dor
Dos
grandes rumores.
É
maior que o mundo
Esta
luz feita na cruz
Dos
grandes tremores.
É
maior que o mundo
Este
amor feito no ardor
Dos
grandes clamores.
Ó
peso da terra,
Cuspe,
chicotada, crivo.
E
das chagas flores.
Canto de Amor
E
todo este peso
Terrestre
perfurou
Na
flor da comunhão,
De
braços abertos
Clamas
como cacto.
E
dignos não somos
De
olhar este rosto
Que
pende no amor
Do
sangue derramado.
E
solitários caminhos
Da
ternura os desviados
Na
voz de tudo que é perdão.
O
canto de amor prossegue
Pelos
que têm fome e sede
E
carregam o dilema do pacto.
Santa
Cruz
Todo
o peso da terra
Com
ofensa e lenho
Aqui
deste desterro.
Pedras cor de vinho,
Setas de veneno
Dos que ladram.
Lábios de sede,
Botão que se abre
Na flor do perdão.
Até hoje a oferta.
A ternura como meta
Jogada na sarjeta.
Sexta-Feira Maior
O
sol morre.
Turva
onda
O
mundo em aflição
Molha-me
de roxo.
Nada
valho.
Nada
sou de fato.
Prefiro
Barrabás,
Crucifico
o amor,
Sem
dó e lágrima
Até
o último gemido.
Soneto da Paixão
Ao
pé do Cristo todas as infâmias,
Ao
pé do Cristo todas as insônias,
Ao
pé do Cristo todas as intrigas,
Ao
pé do Cristo todas as refregas.
Ao
pé do Cristo todos os sedentos,
Ao
pé do Cristo todos os famintos,
Ao
pé do Cristo todos os horrores,
Ao
pé do Cristo todos os clamores.
Ao
pé do Cristo todos os insultos,
Ao
pé do Cristo todos os corruptos,
Ao
pé do Cristo todos os ladrões,
Ao
pé do Cristo todas as prisões.
Nessa
onda que nos leva como cães,
Cura-me,
ó Deus de todas as paixões.
Procissão do Senhor Morto
Tudo
é roxo e ofensa e perdão.
A
tristeza está nos ares,
já
anda pelas veredas
e no
perfume dos caminhos.
No
ocaso da saudade ao longe,
na
flor do cacau que é espinho.
E
chega à igreja a procissão.
Tudo
é clamor e cruz e paixão
porque
uma coroa sensitiva
instalou-se
em Itabuna
com
fadiga e sede e fome
e
escorre suas dores
pelas
pedras cor de vinho,
mas
no sábado tudo é verde
e
claro sem o roxo e o espinho.
Os
sinos repicam na cidade
e um
dia novo está nas galhas,
no
coro de milhões de passarinhos.
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