Devoção da Virgem Maria
Cyro de Mattos
A
imagem da Virgem Maria era guardada no nicho de cedro. Permanecia no altar,
embaixo de Jesus crucificado. A mãe forrava o pequeno altar
com um pano de linho branco. Havia no oratório jarros com flores, velas nos castiçais, eram
acesas quando a mãe ia fazer suas orações.
A mãe organizava a pequena
procissão, ela conduzia à frente a imagem da Virgem Maria, as outras mães
seguiam formando duas filas nas laterais
da rua, uma de cada lado, no meio as
crianças levavam flores nos braços. As velas acesas, os cânticos e as rezas
pela rua. A procissão saía da casa onde
a mãe morava e terminava em outra, que podia estar localizada na rua de cima.
Ali, a imagem da Virgem Maria era entregue à dona da casa, que estava pagando
uma promessa. O filho havia sido lembrado pela santa, fora salvo de uma doença
que atacou o fígado da criança, já estava desenganada pelos médicos. A mãe em
desespero não sabia mais o que fazer. Rogou à Virgem Maria pela salvação do
filho e fez a promessa. Obteve a graça.
Os rostos contritos, as rezas e os cânticos na rua por onde passava a pequena procissão, atraindo
pessoas, que apareciam no batente das portas ou vinham até as janelas.
Ave, ave, ave, Maria!
Ave, ave, ave, Maria!
Aos treze de maio
Na Cova da Iria
Aos três pastorinhos
Apareceu a Virgem Maria.
Ave, ave, ave, Maria!
Ave, ave, ave, Maria!
Soltavam fogos coloridos, adrianinos e foguetes quando
a imagem da Virgem Maria era
entregue pela mãe à dona da casa, que havia
alcançado a graça e estava
pagando a promessa. A imagem da Virgem
Santa permanecia nove dias na casa da dona casa, quando então era rezado à
noite o terço com as filhas de Maria.
Quando a imagem da santa regressava para
a sua casa de origem, a mãe vinha recebê-la na porta. Rezava-se o terço. No
final da reza soltavam-se de novo fogos coloridos.
Com os corações contritos, terminada a reza, os que participavam da
devoção à Virgem Maria regressavam às
suas casas. No outro dia a imagem da Santa era guardada no nicho. Era assim
que, na cidade de vinte mil habitantes, a mãe e outras mães demonstravam o seu
amor e a sua fé por Nossa Senhora. Todos os anos.
*Cyro de Mattos é escritor e
poeta. Membro Titular do Pen Clube do Brasil. Primeiro Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual
de Santa Cruz. Pertence às Academias de Letras da Bahia, de Ilhéus e de
Itabuna. Publicado em inglês, francês, italiano, espanhol, alemão, dinamarquês
e russo. Premiado no Brasil, Portugal, Itália e México.
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