Eduardo Portella: Pensador da
Cultura
Cyro de Mattos
Eduardo Portella era um desses intelectuais atuantes que
argumentava com lucidez sobre assuntos de nossas letras e cultura. Graduado
pela Faculdade de Ciências Sociais e Jurídicas da Universidade Federal de
Pernambuco. Professor Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lecionou até os últimos dias de vida. Ministro
da Educação no governo do Presidente
João Figueiredo, lutou pela anistia, foi demitido por ter dado apoio à greve dos professores universitários.
Seu discurso de vida dirigiu-se para os
parâmetros de um humanismo solidário com base na ordem da verdade. Foi interditado
por aqueles que pensam ser suficiente para valer na dotação humana o poder
que você exerce com o cargo. Dele é a célebre frase: “Não sou ministro, estou ministro”,
para afirmar com isso, no tácito entendimento da palavra enunciada, que tudo é
transitório ante o eterno que fica.
. Crítico, pesquisador, conferencista, editor, advogado e político
brasileiro. Ocupou a
presidência da Conferência Mundial da UNESCO.
Foi
diretor das
Edições Tempo Brasileiro, divulgando Heidegger no Brasil e o Formalismo
Russo de Yuri
Tynianov. Membro titular da Academia
Brasileira de Letras, recebido por Afrânio Coutinho. Naquela instituição recebeu João Ubaldo
Ribeiro, Lígia Fagundes Telles e Zélia
Gattai.
Propôs
um método crítico de base hermenêutica, teórica e filosófica. Sem inclinações
para a interpretação da obra literária com base na inserção de autor e obra nos períodos históricos, nem decorrente de gratuitas
impressões sobre a massa do que foi escrito, mas em função do estilo em que o autor se
funda e marca sua obra na expressividade
da escrita, tanto na forma como no
conteúdo. Esteve à frente dos níveis usuais, sendo o responsável pela introdução da análise
estilística nas letras brasileiras. Filtrou os pressupostos, métodos e ferramentas dos espanhóis Carlos Bousoño e Dámaso Alonso, propondo o julgamento como ato final na análise literária após a
captura do fundamento que transita entre linguagem e uso da língua, responsável pela literariedade. Este fundamento é a visualização do entretexto. Sua tese de doutorado foi publicada sob o título Fundamento da
Investigação Literária (1973),
refundida em 1974.
Deixou um legado constituído de 23
obras e, entre elas, Dimensões I
(1958), Dimensões II (1959), África colonos e cúmplices (1961), Literatura e realidade nacional (1963), Dimensões III (1965), Teoria
da comunicação literária (1970),
Vanguarda e cultura de massa (1978) e
A Sabedoria da Fábula (2011). Recebeu prêmios literários e títulos honoríficos de muito prestígio, como
Gran Cruz de la Orden del Mérito Civil, Madri (2001), Doutor
Honoris-Causa, Universidade Federal da Bahia (1983), Gran-Cruz de la Orden
Civil de Alfonso X, el Sabio, Madri (1980), Grã-Cruz da Ordem do Rio Branco,
Brasília (1979).
Aprendi muito com ele. Acompanhou
minha carreira literária desde o nascimento, há cinqüenta anos. Prestigiava-me.
Prefaciou meu livro Cancioneiro do Cacau,
que me deu quando inédito o Prêmio
Nacional de Poesia Ribeiro Couto da
União Brasileira de Escritores (Rio) e,
quando publicado, o Segundo Prêmio Internacional de Literatura
Maestrale Marengo d’Oro, em Gênova, Itália,
o Terceiro Prêmio Nacional de Poesia Emílio Moura da Academia Mineira de
Letras e foi finalista do Jabuti.
É dele essa observação sobre o livro:
“ Mas o seu poema não irrompe de qualquer abalo sísmico, ou de
qualquer intempérie facilmente previsível. Ele eclode da história revigorada,
nasce do fundo do homem e das coisas, da
sua raiz em curso, da origem protegida
do menor sedentarismo... Cyro de Mattos se compraz em revalorizar a
raiz, e reverenciar a origem, em reconhecer
o fundamento radicalmente
imune ao fundamentalismo. O poeta
enraizado e, no caso, porque enraizado, generoso, recorda para a frente. Como quem retira dos filtros do passado, e dos detectores de metais do presente,
lições, mesmo que enviesadas, para a
construção do amanhã.”
Que melhor prêmio poderia receber
autor e obra do que essa opinião do enorme ensaísta? Humanista, leal, elegante,
sóbrio, companheiro, intelectual de primeira grandeza. A última vez que estive
com ele, na Academia Brasileira de Letras, quando fui proferir palestra sobre os mares trágicos de Adonias
Filho, disse-me que estava escrevendo um livro sobre Adonias Filho e outro
sobre Jorge Amado.
Baiano
de Salvador, nascido em 8 de outubro de
1932, Eduardo Portella passou desse plano terrestre para outra dimensão no dia 2 de maio deste ano.
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