O Comilão
Cyro de Mattos
Era um comilão incorrigível. Não passava
um dia em que não comesse por quatro vezes um prato fundo com uma comida apetitosa.
Insaciável, constante. Quando não tinha dinheiro para fazer uma merenda no
restaurante, que constava de um prato fundo com a iguaria farta, vestia a roupa
maltrapilha, de pés descalços, saía para a rua, pedindo, clamando aos
transeuntes por um dinheirinho para comprar alguma coisa, estava se esvaindo de
tanto passar fome.
- Um dinheirinho, moço, ainda não comi
hoje.
Apertou a barriga com uma cinta de
compressão para não dar na vista que estava com a pança estufada, armazenada de
comidas várias.
O bigodudo homem sisudo respondeu:
- Dou-lhe dinheiro grande pra comprar um
prato fundo de comida, se você morder essa pedra e mostrar que está de fato
faminto.
Arregalou os olhos, a proposta vinha em
boa hora da fome impiedosa. Prontamente mordeu
a pedra como se fosse um pedaço de carne, bem temperado, refogado no arroz
gostoso. Voou da boca dentes para todos os lados. Cuspiu sangue, deu um grito
lancinante. Ficou chorando, ui, ui, quebrei meus dentes, meu Deus, me socorre,
que vou dar um troço!
De agora em diante passou a ser um comilão
mais comedido, sem farsa nem artimanha.
Fazia apenas duas refeições modestas, diariamente.
Não queria correr o risco de perder a dentadura nova, paga em dez prestações,
com sacrifício do que recebia da aposentadoria modesta.
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