Um Pescador Imbatível
(Cyro de Mattos)
De primeiro nadava feito cachorrinho, batendo na água com os pés e, ao mesmo tempo, puxando-a com as mãos. Era uma maneira mentirosa de nadar, só prestava no raso. Ninguém dava valor a quem nadava feito cachorrinho. Comecei a aprender nadar de verdade quando segui o conselho do amigo Duda para engolir uma piaba. Batia agora com os pés na água e, ao mesmo tempo, ia puxando-a com as braçadas seguras. Semanas depois não tinha mais medo de atravessar os poços fundos. De nadador verdadeiro a mergulhador corajoso tudo aconteceu em pouco tempo. Para não falar nos saltos a partir do barranco íngreme. Saltava do alto para mergulhar de cabeça ou dando uma cambalhota no ar.
Antes de aprender a nadar no sério e me tornar um bom mergulhador, pescava com vara de anzol quando então pegava apenas peixes miúdos. Depois que me tornei um nadador e mergulhador de estilo apurado, passei a pegar com a mão o peixe escondido na loca de barro, camarão e acari nas pedras. Quando ia pegar acari, tinha o cuidado de meter a mão por baixo da barriga do bicho, conforme me ensinou o pescador Patrício. “Se você meter a mão por cima, o acari incha, prende sua mão e você morre afogado”, ele disse.
Patrício ensinou-me também a pegar pitu no laço. Era só jogar bolinho de farinha que o pitu saía da loca para comer a ceva. Então pegava o bicho com o laço feito de arame fino preso na ponta da vara. Deixava que ele ficasse comendo a farinha molhada e, quando entrasse no laço, puxava-o ligeiro para fora da água.
Chegava lá em casa agora com a capanga cheia de peixe, acari, camarão e pitu. Minha mãe fazia a moqueca, que comia com os amigos à tarde no pátio. À mesa os pratos com as iguarias no cheiro ativo da moqueca. Os olhos de cada amigo cresciam diante da comida apetitosa a dar água na boca. Enchia meu prato fundo com farofa, arroz e o peixe na moqueca, os amigos faziam o mesmo.
Um dia abri o baú velho, apanhei o estilingue, o pião, a peteca, o iô-iô, o álbum de figurinhas, a bola de couro, os patins e o jogo de botão. Chamei os amigos e anunciei que ia fazer um leilão dos meus brinquedos. Era o primeiro que ia se realizar na Rua do Quartel Velho. Maneca, o filho do advogado Ubaldino Brandão, aconselhou-me que não fizesse aquilo. “Você vende os brinquedos e com o dinheiro apurado no leilão não vai conseguir comprar outros”, disse. Lembrou que, se eu fizesse o leilão, minha mãe não ia gostar e podia não me dar mais brinquedo.
A rua ficou cheia de meninos quando a notícia correu que eu ia fazer um leilão de meus brinquedos. O leilão aconteceu em lances rápidos, mas só não vendi fiado. Nunca tinha visto tanto dinheiro, os bolsos ficaram cheios de cédulas grandes. No dia seguinte fui até ao armazém de seu Júlio Sergipano e comprei a tarrafa novinha, pendurada no prego da parede, que tanto estava me tirando o sono. O dinheiro apurado no leilão deu certinho para comprar a tarrafa.
Era agora o menino mais admirado lá na rua, o único que tinha uma tarrafa para pescar no rio Cachoeira como se fosse gente grande, se bem que pedisse ajuda ao pescador Patrício para arremessá-la nos poços fundos. Quando chegava à minha casa agora, era com o cesto cheio de peixes grandes. Dava alguns peixes para minha mãe fazer a moqueca e ia vender os outros aos vizinhos. Com o dinheiro que apurava com a venda dos peixes ia comprando e recuperando cada brinquedo que tinha vendido no leilão.
Em poucas semanas tive de volta a bola de couro, os patins, a peteca, o pião e o álbum de figurinhas com retrato de artista americano, Cheguei até a comprar um jogo de botão novinho com a mesa do campo que tinha as balizas com rede. Por último comprei um jogo de pingue-pongue, que foi a distração mais procurada pelos meninos lá da rua do Quartel velho durante as férias escolares. Só que para jogar três partidas seguidas de pingue-pongue, cada jogador tinha que pagar um bom dinheirinho ao dono do jogo.
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