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domingo, 16 de novembro de 2014

Poemas do Negro





                                                                                Cyro de Mattos



                                         Candomblé

Preceito e respeito.
Se for de paz, entre.
Vamos conversar
Com os orixás.
Vamos dançar.
Vamos cantar.
Também se come
A comida de lá.
E se bebe aluá.
Fique sabendo
Da África sabores,
Ritos e cores.
Quem é do axé 
Não nega que é.








Abolição

     
Na zoeira do terreiro
Batucam que batucam
Tambores sem cambão.

Trepidam nesses punhos
O suor, a lágrima, o sangue
Nos rastros do negro fujão.

Todos batem nesse tambor,
Pode até não ser de fato
A tão esperada abolição.

Mas é o começo duma hora
Que se faz tão grandiosa
Como o verde na amplidão.

 África agora é uma só voz
Na esperança das manhãs
Sem o ferro do vilão.

  Ibejis
                                                                  
                                       A travessia de Iansã
                                       Com a sua espada afiada
                                       Na floresta desconhecida.

Suas queixas aos orixás
Pelo filho que lhe roubou
O rude vento assassino.

As graças do Orun,
Lá no reino de Oyó,
À guerreira destemida.

Ao invés de tristeza
O  milagre da alegria
Anunciado por borboletas.

Gente pobre bonita,
Pintura festiva da vida,
Tanto canto, tanta música.

Nos fios sem fim da poesia,
Com leveza na escrita,
Feita memória e fantasia.

A lenda de Ibejis
Da Nigéria à Bahia
É o que conta Edsoleda.

Preto Velho
Me ensinou,
Sim senhor,
Me ensinou,
Com sua figa,
Cachimbo e pó,
O seu patuá,
O canto manso
E fé maior.

Um abraço dado
De bom coração
É mesmo
Bom abrigo,
Uma bênção,
Uma salvação.

         
            Vovó Maria Conga
         
         Saia branca engomada,
         Pulseiras em cada braço,
         Figa de guiné. Miçangas.
         Filha de Nanã Burucu.
         Dos orixás das águas
         A mais velha Nanã é.
       
         Conhece os caminhos,
         Fala com os orixás
         Na língua vinda da África.
         Na dança bonita de ver
          Movimentos vagarosos
                            Como onda leve do mar.

Rezou a menina, baforou
Com o velho cachimbo.
Deu passes na testa.
Saiu um bicho medonho
Esgoelando-se. Pela janela
Fugiu numa nuvem escura.
Grande medo causou.  

Nem ligou. Cuspiu.
De contente sorriu.

Quá-quá-quá
Quá-quá-quá.

Vozes doces e quentes
 Das filhas cantando:

Cadê a sua pemba,
Cadê a sua guia,
Seu congado
Veio de longe,
Veio pra ficar
 Aqui na Bahia.

Cabelos brancos
Parecendo de  bucha.
Olhos miúdos e negros.
Sua voz aconselhando:

Vovó não quer casca
 de coco no terreiro
pra não lembrar
do cativeiro.

Suas filhas dançando
Numa ciranda branca.
Repetindo a cantiga
Que ela mais gosta.

Quá-quá-quá
Quá-quá-quá
Chega vovó,
Chega vovó

Pra dar sua bênção,
Sua cura, seu axé,
Seu passe, sua flor
Que só vovó sabe dar.

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