Uma
Rosa para Aqueles Doidos Mansos
Cyro de Mattos
A cidade tinha seus doidos mansos,
suas manias faziam com que gente adulta sorrisse e os meninos mangassem quando
deparavam a cena engraçada. De tão mansos mal não faziam a uma mosca. Ingênuos,
indefesos, triste gente perseguida pelo fado. Incansáveis atores na vida
diária, funcionavam como o riso da rua. Havia Mula-Manca, só andava bêbado, mal
se aguentava nas pernas, tropeçava nos passos. Maria Camisão suspendia de
repente a camisola e mostrava a parte debaixo, entre as pernas, coberta com o
tufo de cabelo. Ela dizia nomes feios, oferecia a quem quisesse o sexo cabeludo
aparentando uma coisa horrenda. Zeles Carnavalesco pela rua saracoteava, tremia
como um boneco elétrico em tempo de carnaval. Não parava de pular, mexer e
rodar na frente do bloco carnavalesco.
O tal de Jipe se dizia portador dentro dele de um carro de corrida, que
não tinha preço. Saía disparado pelo calçamento, buzinando. Na avenida do
comércio, passava veloz segurando numa mão uma placa com o número do carro e na
outra um farol sem lâmpada. Chiranha era
o que adivinhava qual seria o número sorteado no jogo da loteria. Ainda tinha o
doido Paturi, um meio azoado, ele virava uma fera quando era arreliado com aquele
apelido que detestava.
E o Ciro Mergulhador?
Quando o gaiato dizia:
- Ciro Mergulhador!
A resposta era uma só:
- Atrás de moça bonita!
Todos eles exerciam seu papel
particular na vida da cidade. O tal Jipe fazia o preparo físico para fortalecer
o fôlego pela madrugada, indo e vindo disparado muitas vezes na travessia que
fazia no piso da Ponte Velha. Até que chegava como um vento veloz ao centro da
cidade, buzinando, gritando para que a pessoa saísse da frente, se não quisesse
ser atropelada, estava com pressa, ia calibrar os pneus de seu carro para uma
viagem que faria naquele dia até a cidade vizinha de Ilhéus. Não queria chegar
atrasado no local de saída, as pessoas que iriam ser conduzidas na viagem poderiam
desistir com o atraso de seu jipe e irem embora.
Lembro de todos eles, como se estivessem agora ressurgidos do tempo
longínquo, que se esfumou na curva dos anos. Exsurgem com suas graças e
ingenuidades de gestos para fazer a cidade mais humana, com sons e cores de uma
gente que divertia a vida sem querer nada de volta. Doidos mansos de minha terra, anunciados pelo
destino em cada número do teatro da
vida, como se fossem figuras grotescas, mas que eram queridas por gente grande
e pequena, pelo espetáculo que era dado de graça.
Mula-Manca, Maria Camisão, Ciro
Mergulhador, o tal Jipe falado, Zeles Carnavalesco, Chiranha, mais Paturi, porque
me fizeram um menino alegre, dedico-lhes agora essa crônica como se fosse uma
rosa que emerge com o seu perfume suave do lugar onde não morre a ternura.
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