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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

 

  CARNAVAL ANTES

 Cyro de Mattos

 

Em Itabuna, antigamente os vizinhos costumavam colocar cadeiras no passeio para desfiarem um dedo de prosa. Esse costume servia para que estreitassem os laços de amizade, distraindo assim a mente cansada dos afazeres diários. Com a lua clara prosseguia a conversa animada entre os vizinhos, geralmente em torno de um assunto interessante ligado à cidade, até quando fosse chegada a hora de se recolherem no sono que descansa e reconforta. Numa dessas conversas entre vizinhos, eu escutei seu Zeca, o dono da farmácia, dizer a meu pai que o começo do carnaval em minha cidade remontava ao ano de 1908. A festa naqueles idos era conhecida como “Domingo do Entrudo”.

 

Escutei também o dono da farmácia dizer que no começo os bailes carnavalescos eram realizados no armazém da rua do comércio ou no Cine Odeon. Com a inauguração do primeiro clube, em 1940, os bailes mudariam de cenário. Durante quatro noites e duas matinês, foliões adultos e pequenos iriam ser acolhidos agora nos salões de um clube. Ao lado do carnaval nas ruas, a folia passava a contagiar no clube os blocos formados por senhores e senhoras, rapazes e moças da elite. De bigode retorcido nas pontas, de braço dado com as esposas, esses senhores sisudos davam voltas contínuas no salão. Bem entusiasmados, não paravam de cantar as marchinhas “Linda Lourinha”, “Pirata da Perna de Pau”, “As Pastorinhas”, “Touradas em Madri”, “Alá-Lá-Ô” e tantas outras que ficaram famosas em nosso cancioneiro popular.

 

O Carnaval de ontem era do tempo da serpentina, confete e lança perfume só para animar. Era o carnaval da musa colombina, pierrô apaixonado, arlequim sonhador, palhaços que não paravam de brincar e soltar piadas para as moças. Era o Carnaval dos quadros satíricos em que não faltavam fantasias e brincadeiras bobas. Era comum a sátira ser usada por blocos e cordões. Aproveitava-se um fato político, econômico, social ou esportivo com repercussão no ano como assunto engraçado para animar o carnaval.

 

Pessoas de minha cidade, que pertencem a uma geração mais velha, tem saudade do Carnaval daquele tempo. Uma dessas pessoas é seu Sessa. Funcionário Aposentado do Banco do Brasil, outrora folião dos mais animados, disse certa vez que nunca vai se esquecer daquele palhaço irrequieto e da pastorinha enamorada. Daquele palhaço de calças folgadas e nariz de limão, que não parava de pular e soltar piadas no salão quando a orquestra fazia uma pausa para que os foliões descansassem um pouco.

 

Já vai longe o tempo em que o carnaval começava cedo, aos sábados. Vestindo calça listrada, sem camisa, usando cartola e fraque, o Zé Pereira aparecia tocando o bombo, com meninos sujos e afoitos atrás. Batia forte no bombo o Zé Pereira, em frente às lojas e armazéns. Já vai longe esse tempo, o Zé Pereira ordenava a toda voz aos comerciantes que fechassem suas portas. É pra já! Cedo a folia vai tomar conta da cidade, ele dizia.

 

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