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segunda-feira, 24 de março de 2014

Dois Lembretes
Florisvaldo Mattos

  
  O GRANDE SOM ENTRE SURDOS

O artista, poeta e compositor Bené Fonteles publica artigo hoje (A Tarde, Opinião, llA3) de máxima clarividência, amplo conhecimento de técnicas e história musical e maior ainda oportunidade, no qual lamenta não estar vendo ou sentindo qualquer iniciativa de dimensão à altura em comemoração ao centenário de Dorival Caymmi, um ícone da música popular brasileira, de expressão nacional  e internacional  (inicialmente pela voz de Carmen Miranda e dele próprio, e depois de Dick Farney e de um sem-número de intérpretes, inclusive o grande artista da bossa-nova e também baiano, João Gilberto. O texto é um libelo contra as faltas de memória e desídias, público e privada. Cita algo calamitoso que pelo menos a mim me passou, lembrando que “Caymmi não foi homenageado no carnaval deste ano”, e diz desconhecer se “há alguma mostra dedicada a ele, como se fez para Luiz Gonzaga em 2012 no Palacete das Artes”.
Embora em nível com a dimensão merecida, eu sei de uma programação: em agosto, mês de transcurso do centenário de nascimento de Caymmi, serão promovidos na Academia de Letras da Bahia um seminário sobre ele e sua obra e uma cerimônia solene em homenagem  à sua memória. Mas, mesmo reconhecendo a altura desse gesto da ALB, convenhamos que é ainda muito pouco, em face da altitude significativa da data.
Invoco os préstimos de quem bem maneja esses trabeculados de internáutica, que eu, pobre troglodita virtual, não possuo, para tentar reproduzir na íntegra o precioso texto de Fonteles, aqui no Facebook. Como mero antepasto, limito-me a transcrever a sua peroração final, para que se perpetuem as canções e a memória de Caymmi, filho  e obá de Xangô,  para as novas gerações:
“Fazê-lo renascer em nossa memória, recriar de forma instigante e contemporânea suas criações e avivar sua voz forte e original é dever de todos nós”.
Eu completo, parafraseando, um slogan presente em miríades de placas e propagandas de TV:
“Por uma Bahia de todos nós”.  Mesmo cheia de nós, os reais e intrincados...

POETA JACINTA PASSOS

E vem mais aí, não mais um chamamento aos surdos, mas à própria inteligência de arte literária, e espero que, neste caso, os setores públicos não mais se enrosquem em metros de arame farpado. Em novembro, ocorre o centenário da poeta Jacinta Passos (1914-1993), a mais expressiva voz poética da esquerda brasileira, primeiro pondo a sua voz no combate ao nazifascismo e, simultaneamente, por ser figura de proa do Partido Comunista Brasileiro, com vários livros publicados nos anos 40 e depois. É filha de Cruz das Almas (por isso, talvez por lá não a esqueçam). Eu fico a cavaleiro nisso, pois em 1989, quando presidente da Fundação Cultural no governo Waldir Pires, por ingerência dos fados, como disse em um artigo, empenhei-me pela reedição de seu principal livro "Canção da Partida", de 1945, e estava totalmente esquecido, com uma poesia que falava diretamente, em nível lírico, aos sentimentos populares. É hora de o pessoal se movimentar para render homenagem à memória dessa grande poeta, pioneira da poesia feminina de esquerda no Brasil.


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